Jeremias Macário: “Existe uma prostituição da mídia, a verdade é essa!”

O jornalista relembra sua trajetória em Conquista, faz crítica ao jornalismo e aponta saídas para os futuros profissionais 1 de maio de 2016 Nayla Santos

Um chapéu sobre a cabeça e centenas de livros na estante. Esses são elementos que caracterizam e revelam a personalidade de Jeremias Macário, jornalista com mais de 30 anos de experiência.

Jeremias, além de fazer parte da história do jornalismo conquistense, é ele próprio um guardião desta história. Na sua casa, publicações e trajetória de vida são um convite ao aprendizado para aqueles que se dispõem ao conhecimento.  E as suas coisas não são só coisas: ultrapassam a materialidade e são a expressão da sua identidade.

Ao entrar em sua casa, a primeira visão ao passar pela porta é a sala de estar, local que causa admiração. Nela está um acervo de 3.455 peças, com 1.075 livros dispostos e organizados por categoria numa estante de madeira que ocupa toda a parede esquerda. No lado direito existem ainda oito cabideiros com os 120 chapéus de diversos países que o jornalista ganhou de presente e mais de 300 vinis. Mas não acaba por aí, Jeremias ainda coleciona molduras com fotografias de sua autoria, uma mesa com seis bancos e ainda sofás, escrivaninha com uma antiga máquina de escrever, peles de animais espalhadas pelo chão, CDs e objetos artesanais. As paredes da sala, onde tudo está reunido, levam ainda cores fortes e chamativas.

Jeremias nasceu em 1953 na zona rural em Mairi, porém, seu registro é da cidade de Piritiba, Bahia. Filho de Mateus Macário de Oliveira e Maria Madalena de Oliveira, é o segundo de três irmãos.  O jornalismo? Ah, esta não era sua primeira opção profissional, ele sonhava com os púlpitos das catedrais, queria mesmo ser padre. Foi por isso que ele estudou oito anos em seminário teológico, onde desenvolveu o hábito da leitura. Depois desse período,  percebeu que essa não era sua vocação e só então optou pelo jornalismo.

A instituição escolhida para a graduação foi a Faculdade de Comunicação e Biblioteconomia da Universidade Federal da Bahia (Ufba), hoje Faculdade de Comunicação (Facom). Formou-se em 1973, época da ditadura militar. Logo após a sua formatura, Jeremias começou a trabalhar no jornal A Tarde, na sede em Salvador. Lá ele trabalhou durante 19 anos.

Em Vitória da Conquista, ele chegou em 1991, veio trabalhar como chefe na sucursal do jornal A Tarde.  Segundo ele, jornalistas não eram bem vistos na cidade. “Eu vim sozinho e me estabeleci aqui. Fiquei em um hotel. Só depois eu trouxe a família e resolvi alugar uma casa.  Aí, eu tive uma dificuldade grande em alugar uma casa e eu não sabia qual era o motivo. Depois, eu fui procurar saber e disseram-me que a imagem de jornalista aqui era muito negativa. Se você dissesse que era jornalista, nego batia a porta na sua cara”.

Durante 20 anos como jornalista do A Tarde em Conquista, ele acompanhou a  transição do impresso para o online. “O declínio do impresso veio justamente com o advento da internet”, opina. “Foi uma coisa automática, porque substituíram o impresso pelos blogs, mais ou menos no final da década de 1990 para o início de 2000”.

Segundo ele, o primeiro jornal a cair foi “Radar” e, em seguida, o “Opinião”, já o “Impacto” conseguiu sobreviver um pouco mais, mas também chegou ao fim. A sucursal do A Tarde foi extinta em 2010. Em novembro de 2005, quando saiu do jornal, o jornalista lançou o seu livro “A imprensa e o coronelismo no sertão do sudoeste”, uma análise sobre a trajetória histórica do impresso conquistense.

Em relação aos blogs, Jeremias avalia que no início não havia uma linguagem que diferenciasse o meio virtual do impresso e que, hoje, as publicações mantêm um padrão factual e, principalmente, oficioso. Os blogs seriam reféns do poder público. E essa característica teria sido herdada dos jornais que existiam na cidade na década de 1990. “Existe uma prostituição da mídia, a verdade é essa!”, desabafa o jornalista.

Apesar de aposentado, o jornalista tem uma questão em aberto sobre Conquista, a terceira maior cidade da Bahia: “Por que não tem um jornal diário?”. Ele não sabe responder se é por causa da mentalidade das pessoas, por questões culturais, pelos profissionais que não tiveram persistência ou por questões de mercado. “Se eu tivesse condições, tivesse dinheiro, eu montava um jornal. Eu acredito [no sucesso de] em um diário aqui em Vitória da Conquista”, enfatiza.

A saída para a revitalização do impresso em Conquista, segundo Jeremias, seria uma parceria entre a Uesb (Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia), os empresários e a própria sociedade. “Eu acho que haveria condições da própria universidade alavancar um projeto desse porte.” O projeto seria inicialmente montar um jornal diário na cidade e futuramente pensar em outras áreas da comunicação. “E o curso de Jornalismo da Uesb seria fundamental nessa questão, pois iria abrir portas de emprego para o profissional do jornalismo, que não encontra espaço para trabalhar na área em que escolheu.”

Para ele, apesar das dificuldades da época em que atuou na profissão, as informações eram publicadas depois de uma apuração mais aprofundada. Já hoje, critica o jornalista, o jornalismo, principalmente o da internet, está banalizado. “Para você exigir liberdade de imprensa, você tem que ter responsabilidade”.

Fotos: Nayla Santos

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