Professora acusa Prefeitura de Conquista de perseguição

Entenda como uma fábula infantil pode ter sido o motivo para a exoneração da servidora pública Ana Cláudia Santana 16 de fevereiro de 2019 Jade Dias

A administração de Herzem Gusmão tem sido marcada por conflitos. No dia 21 de julho de 2018, o Sindicato do Magistério Municipal Público (Simmp) de Vitória da Conquista deu o primeiro passo para o que viria a ser um embate acirrado entre professores municipais e poder público: deflagraram greve por tempo indeterminado. As demandas dos professores diziam respeito à campanha salarial de 2018. A Prefeitura Municipal então propôs um reajuste de apenas 2,76%  no Piso do Magistério, cerca de 4% a menos que o determinado pelo Ministério da Educação (Mec) para o Piso Nacional. Diante dos muitos protestos realizados na época, já em setembro do ano passado, a Secretaria de Educação determinou o corte salarial referente aos dias de greve da categoria, ou seja, 31% dos vencimentos mensais dos docentes.

A greve chegou ao fim no dia 13 de agosto deste ano. Entre os professores grevistas estava Ana Cláudia Santana, professora concursada que exercia a função de coordenadora pedagógica na creche municipal Ana Jerusa Bittencourt Ferraz, no bairro Nova Cidade. Cláudia, como prefere ser chamada, optou por expressar a sua indignação também em postagens nas redes sociais denunciando promessas de governo que não foram efetivadas e criticando decisões políticas do prefeito Herzem Gusmão. Em suas publicações, ela acusou o governo de estar se valendo de discursos “tolos e fascistas”. Além disso, ela ironizou: “pobres coitados, são apenas vítimas da nossa categoria sem consciência que não compreende os pobrezinhos”, e usou o bordão: “história da carochinha, conversa pra boi dormir”.

O barulho de Cláudia teve destaque em agosto de 2018 quando a gestão deu início às discussões sobre o material didático a ser utilizado nas escolas municipais. De acordo com o MEC, uma das possibilidades é a escolha fragmentada do material. Nesse modelo, cada escola escolhe seus livros de acordo com a identidade e os princípios da instituição. Porém, Cláudia afirma que a Secretaria da Educação “manipulou a escolha priorizando a Editora Moderna” ao não revelar às escolas que existia essa segunda possibilidade. Insatisfeita, ela enviou um áudio em um dos grupos de mobilização criados durante o período de greve alertando os docentes da manobra. Esse áudio foi compartilhado até chegar à Secretaria da Educação, quando, segundo ela, começou-se a especular a sua provável exoneração.

Cerca de um mês depois, no dia 27 de setembro, Cláudia compareceu ao Curso de Formadores de Contação de Histórias ministrado pelo Escritor Augusto Pessoa para os Educadores da Rede Municipal promovido pelo Programa Nacional de Incentivo à Leitura (Proler Uesb) em parceria com a Secretária Municipal de Educação. Ali, os profissionais da educação se reuniram com o cenógrafo, dramaturgo e contador de histórias e, além de ouvirem os contos do autor, foram incentivados a escreverem seus próprios contos e crônicas, para, em seguida, declamarem para o público.

Ana Cláudia foi autora da seguinte fábula:

“Era uma vez um grande pasto, que tinha um bode que vivia a berrar. Em seu berrado, ele dizia que quando ele fosse o líder do grande pasto, tudo seria diferente.Os animais esperançosos, especialmente as ovelhinhas que trabalhavam para o bom funcionamento do pasto, declaram o bode o grande líder do pasto. Só que elas não contaram com a fúria do bode. O bode não queria proteger ninguém, a não ser a sua comunidade bodesca. Os carneirinhos revoltados combinam um plano para acabar com o bode. Seguindo o plano, eles dão um berro bem forte, um berro ensurdecedor fazendo estourar os tímpanos do bode que correu em disparada e ninguém teve notícias dele.”

Herzem Gusmão Pereira, hoje prefeito de Vitória da Conquista, foi um radialista e comentarista político que, no passado, recebeu de seus opositores e críticos alguns apelidos, entre eles “bode”. A professora afirma que o uso do termo foi apenas uma coincidência. Contudo, no dia 30 de outubro do ano passado, pouco mais de um mês após o curso de contação de histórias, dois dias após o resultado das eleições presidenciais, foi divulgado o Decreto Nº 18.970 no Diário Oficial em que Ana Cláudia Santana da Mata Silva aparecia exonerada da função de confiança como coordenadora da creche.

A docente seguiu trabalhando até que uma de suas colegas lhe informou da decisão. De acordo com a lei que rege os direitos dos Agentes Administrativos Públicos de Vitória da Conquista, a exoneração de servidores comissionados não exige justificativa ou aviso prévio. Apesar disso, segundo Cláudia, ela foi “exonerada por perseguição política”. O Decreto foi divulgado no dia seguinte ao comentário de Ana Cláudia em sua rede social em que demonstrava a insatisfação com o governo do atual prefeito de Conquista. A funcionária pública ainda salienta estar se valendo do seu direito de liberdade de expressão, “o direito de ser sindicalista, não negligenciando nem o meu trabalho nem minha função”. Após a exoneração, professores e alunos da creche Ana Jerusa fizeram um abaixo assinado pedindo pelo retorno da coordenadora ao cargo, mas não obtiveram resposta.

Com relação às acusações de perseguição política, de acordo com o advogado Adwaldo Lins Peixoto Neto: “ela (a professora) pode recorrer para retornar ao cargo e, também, pode fazer uma denúncia no Ministério Público. O argumento cabível é o de improbidade administrativa porque viola princípios da administração como, por exemplo, impessoalidade. Nenhum servidor público é obrigado a apoiar o gestor”. Já no que diz respeito às acusações de censura, o regime disciplinar dos servidores públicos aponta que o servidor é proibido de “referir-se, no exercício do cargo público, de modo depreciativo ou desrespeitoso às autoridades públicas ou aos atos do poder público, mediante manifestação escrita ou oral, podendo, porém, criticar ato do poder público, do ponto de vista doutrinário ou da organização do serviço, em trabalho assinado”.

Após o episódio, a professora afastou-se de suas funções por 15 dias diagnosticada com Síndrome de Adaptação, doença ligada ao estresse que pode levar à depressão. Atualmente, ela voltou às atividades do magistério e pretende ir adiante com a denúncia no Ministério Público por assédio moral, acusando a prefeitura de ferir o seu direito sindical e a sua liberdade de expressão.

O Avoador entrou em contato com a Secretaria de Comunicação da Prefeitura em fevereiro deste ano, mas até a publicação desta matéria não recebemos nenhum comunicado em resposta as acusações da professora Ana Cláudia Santana.

Foto destacada: reprodução Facebook

Uma resposta para “Professora acusa Prefeitura de Conquista de perseguição”

  1. […] para dialogar sobre as demandas dos servidores da educação e o sentimento de insegurança e perseguição dos profissionais são os motivos das críticas ao “14º salário”. Segundo depoimentos, a classe se sente […]

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *