São João na Bahia é símbolo de empreendedorismo

Os festejos juninos ainda nem começaram, mas o clima de São João já é visto e sentido pelas ruas e lojas da Bahia 31 de maio de 2024 Murilo Trindade

Primeira semana de maio, mês em que o comércio deposita suas expectativas nas vendas de Dia das Mães, porém, pelas ruas da Bahia, o clima já é junino. Em Vitória da Conquista, os tradicionais corações que enfeitam as lojas, para seduzir os filhos a presentear suas mães, perderam destaque para as coloridas bandeirolas. Elas cobrem as ruas do centro da cidade, mostrando que, a cada ano que passa, a festa de São João é antecipada e se estabiliza no calendário como um triunfo do empreendedorismo e um importante gerador de emprego e renda, no interior da Bahia.

O professor e mestre em Ensino de História, pela Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (Uesb), especializado em História Social, Cultural e Política, Osmundo Macário Neto, dá detalhes sobre o surgimento dessa celebração no Brasil. “As festas juninas têm suas origens na Europa, estavam ligadas ao solstício do verão, e tem na fogueira um dos elementos mais antigos. Com o avanço do cristianismo no Império Romano na Antiguidade e no decorrer da Idade média, as festas de origem pagãs foram cristianizadas, recebendo novos elementos.”, conta Osmundo. Ele relembra que a vigília do nascimento de São João é uma das cerimônias religiosas mais antigas da Igreja, e que no Brasil herdamos a festa dos colonizadores portugueses.

A festividade também movimenta um importante setor da economia, o de casamentos: “Em nosso país a festa ganhou as casas dos brasileiros que desde o império festeja com fogos de artifício e muitas simpatias. Durante a colônia, São João era invocado para abençoar os casamentos, sendo comuns os noivos escolherem as festas de junho para celebrarem suas núpcias”, enfatiza o professor. Ainda, é importante lembrar que outros dois grandes santos são celebrados no decorrer do mês de junho, fazendo desse período uma festança, do início ao fim. São eles Santo Antônio de Lisboa, que no Brasil ganhou fama de santo casamenteiro, celebrado dia 13 de junho, e São Pedro, patrono das viúvas e pescadores, no dia 29 de junho.

No Nordeste brasileiro, a festa também é de aromas e sabores. A culinária nordestina movimenta milhões, durante o mês de junho, e é uma das maiores lembranças dessa época. Os derivados de milho, mandioca e amendoim geram um ciclo de positividade na economia, desde o campo, onde são plantados, até as barracas de comida típica onde são degustados.

Alzira Ribeiro, de 74 anos, que tem um box na Central de Abastecimento de Vitória da Conquista (Ceasa), garante que as vendas aumentam em junho: “O pessoal faz hora extra, trabalha a mais, aí dá para cobrir a vendagem”. Na Ceasa, ela é conhecida como Zinha dos Biscoitos e vende uma tradicional iguaria conquistense, o biscoito avoador, derivado do polvilho de mandioca, além de uma rica variedades de outros biscoitos. “Tem que ter um biscoitinho para tomar café, né?! No São João a maior vendagem é a do chimango. Chimango e avoador”, revela a feirante.

Dona Zinha dos Biscoitos, em sua barraca na CEASA de Vitória da Conquista. Foto: Murilo Trindade

Para mim é a festa mais importante do Brasil”, relata o Secretário de Cultura de Vitória da Conquista, Xangai, que também é músico e artista reconhecido nacionalmente, um “cantador”, como ele se define. Em 2024, projeta-se que o São João de Vitória da Conquista, o Arraiá da Conquista, que acontece de 18 a 22 de junho, seja ainda maior que o do ano anterior, 2023, com atrações de prestígio nacional como a consagrada cantora Elba Ramalho, o jovem talento Nadson Ferinha, Amado Batista, Frank Aguiar e ainda mais de 40 artistas do próprio município.

O dinheiro desembolsado para bancar a tradição junina na cidade é investimento, afirma Xangai: “Em Vitória da Conquista ela movimenta o comércio em geral. Porque, vamos dizer assim, toda casa tem uma fartura de comida no São João, desde a mais humilde à mais suntuosa. Então, onde é que compra?”. O Secretário esclarece que a festa “movimenta o comércio da carne, da farinha, do biscoito, os ingredientes e tudo mais. As roupas, que as pessoas se paramentam, camisas e calças, botas para se fazer de integrante na festa. O comércio se locupleta por conta desse todo. É empreendedorismo também. Ela fortalece a parte comercial. Muito, muito, muito”.

Xangai Cantador, Secretário de Cultura de Vitória da Conquista. Foto: Murilo Trindade

 Além da música, que movimenta a economia, por todo o Nordeste, durante o mês de junho, com atrações regionais e nacionais se apresentando nos palcos, a dança é outra forte característica da festa de São João. As tradicionais quadrilhas juninas, misturam um contagiante bailado ao ritmo do forró, xaxado, xote e baião. Com dezenas de componentes e meses de preparação, elas criam um ciclo produtivo que beneficia diversos setores da economia, especialmente os micros e pequenos empreendedores.

Elisangela Alves, marcadora e uma das diretoras da quadrilha junina Buscapé, da cidade de Caculé, conta que depois que a quadrilha passou de caipira para estilizada, com passos e figurinos mais elaborados, o tempo de preparação aumentou. “São seis intensos meses, que inicia com a escolha e estudo aprofundado do tema, até chegar aos treinos finais, às vésperas da apresentação”, como ela revelou.

Elisangela Alves, durante apresentação da quadrilha junina Buscapé, em Caculé (BA). Foto: reprodução Instagram/Prefeitura de Caculé

“A quadrilha junina Buscapé contribui para a economia de Caculé e região, através da compra de tecidos e apetrechos diversos para o cenário; contratação de mão de obra para costura, cenografia, gravação das músicas, bordadeiras, pinturas, impressões, dentre outros”, explica a caculeense. Em 2024, o investimento será de aproximadamente 48 mil reais, obtidos por investimento público e privado. A quadrilha atualmente conta com 60 integrantes, entre dançarinos e colaboradores, que se esforçam para entregar o espetáculo visual esperado o ano inteiro pela população. “A quadrilha junina além de cultura e arte, é um local de inclusão social”, orgulha-se Elisangela.

O gerente administrativo da Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL) de Vitória da Conquista, Antônio Vilmar, diz que é tradição do órgão se preparar com antecedência para o mês de junho: “É uma grande data para o comércio de Conquista. Nós fazemos campanhas promocionais nesse período. O São João movimenta muito mesmo e esse ano já tem muita gente na rua comprando, antecipando compras, até para revender em cidades da região. A perspectiva é que vai ser bem melhor que ano passado”. Ele também esclarece que muitos comerciantes pediram para antecipar as tradicionais bandeirolas que cobrem as ruas de cores nessa data. A Prefeitura Municipal acatou o pedido, antecipando o clima junino na cidade e acendendo a chama da fogueira no coração de quem ama São João e principalmente de quem precisa dessa data para empreender, vender e garantir seu sustento.

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