Transporte público de Conquista tem apenas 6 mulheres motoristas
Na cidade, das 13.083 habilitações nas categorias AD, D e E, para a condução de veículos de grande porte, 276 pertencem a mulheres e 12.807 a homens 21 de novembro de 2024 Por Rafaella Leite“Me sinto empoderada. Eu fui a primeira pessoa a entrar com um ônibus no terminal após a nova inauguração. Na profissão, o maior obstáculo que enfrentei foi a falta de confiança das pessoas. Até conquistar, de fato, o espaço como motorista, é preciso provar que somos capazes de trabalhar na rua”, disse a motorista da Viação Rosa, Cleusa Borges, de 48 anos.
Mais conhecida como “Keu”, ela trabalha no transporte público de Vitória da Conquista há 22 anos, e é uma das seis mulheres que ocupam cargos como motorista ou manobrista, no transporte coletivo da cidade. De acordo com o Departamento Estadual de Trânsito da Bahia (Detran-BA), o município possui 119.491 motoristas habilitados, sendo 13.083 registrados nas categorias AD, D e E, aqueles responsáveis pela condução de veículos de grande porte, como ônibus, caminhões e carretas. Desse total, 276 são mulheres, enquanto 12.807 são homens.
Em Conquista, a quantidade de motoristas mulheres nas categorias AD, D e E que exercem a profissão de forma remunerada ainda é inferior à dos motoristas do sexo masculino. Enquanto 8.765 homens atuam no setor, apenas 197 mulheres recebem por desempenharem a mesma função.
A Atlântico Transportes, empresa que também integra a frota de coletivos de Vitória da Conquista com 72 ônibus, conta com 160 motoristas, sendo 4 mulheres e 156 homens. Entramos em contato com a Viação Rosa, que não respondeu aos questionamentos. De acordo com funcionários, apenas duas mulheres exercem essa função na empresa.
Uma das iniciativas que têm ajudado a inserir mais mulheres no setor é o projeto “Escolinha”, da Atlântico Transportes. O gestor de operações da empresa, Marco Viegas explicou que a ação capacita cobradores e cobradoras que desejam mudar de função para se tornarem motoristas.
“Nossa visão é expansiva, quebramos paradigmas de uma questão cultural. Durante o treinamento, as mulheres que participam do projeto realizam serviços internos, como manobras dentro da garagem e transporte de veículos para abastecimento e manutenção, até adquirirem a experiência necessária para atuarem como motoristas, com o aval do padrinho”, detalhou Marcos.
Pupila da “Escolinha” Marta Barreto, de 47 anos, iniciou a carreira no transporte coletivo como cobradora e, após um ano de treinamento, assumiu o volante. Ela trabalha atualmente na linha D36, entre Morada dos Pássaros e a Uesb, e transporta cerca de 400 passageiros por dia. Para Marta, ser motorista é a realização de um sonho. “Para tirar a minha habilitação, vendi lanches, cocadas e cosméticos. Apesar das dificuldades, eu realmente gosto de ser motorista, porque tenho a oportunidade de levar e conhecer muitas pessoas.”
A motorista é também defensora da ampliação da participação feminina no transporte público da cidade. “O coletivo precisa de mulheres, e elas não devem desistir de seus objetivos”, disse. “O treinamento é uma etapa desafiadora, às vezes trabalhamos à noite e saímos de madrugada, mas Deus sempre nos sustenta.”
As dificuldades da profissão não abatem Marta, que tem recebido reconhecimento e carinho. Emocionada, ela relembrou uma vez em que recebeu um bilhete de uma passageira durante o itinerário com a seguinte mensagem: “Sinto-me grata por ter te conhecido. Quero que saiba que és inspiração de força, coragem, determinação e simpatia.”
Outra motorista de Conquista é Bruna Sousa, que trabalha há três anos na Atlântico Transportes. Responsável pelas rotas das linhas R22 e R23, que ligam Morada dos Pássaros e Vila América ao Centro, ela afirmou ser apaixonada pela profissão e revelou já ter recebido uma surpresa de aniversário dos passageiros e do cobrador. “Eu chorei muito de alegria dentro do ônibus.'”
Apesar das experiências positivas, Bruna já enfrentou momentos difíceis e desafiadores por ser uma motorista mulher. “Como transporto muitos passageiros ao longo do dia, infelizmente, já ouvi comentários preconceituosos e sofri assédio, mas sempre fingia não entender”, relembrou.
Rodando o volante
A maior parte dos motoristas homens têm de 11 a 30 anos de experiência ao volante (7.626), seguido pelos motoristas com 31 a 50 anos de atuação (3.167) e mais de 50 anos de experiência (492). Aqueles com 5 a 10 anos somam 1.353, e de 1 a 4 anos, são 169.
Por outro lado, as motoristas mulheres se distribuem de maneira mais equilibrada entre os anos de atuação, com 39 mulheres com 31 a 50 anos de prática, 200 com 11 a 30 anos, 34 com 5 a 10 anos e duas de 1 a 4 anos.
Cargos operacionais
A baixa presença feminina em cargos operacionais também se reflete entre o grupo de fiscais das duas empresas que operam na cidade. A equipe responsável por monitorar as rotas, atender ao público e elaborar relatórios sobre ocorrências, como atrasos e problemas mecânicos têm apenas uma mulher entre os funcionários.
Para a coordenadora de tráfego da Viação Rosa, Lília Novais, representar as mulheres em setores tradicionalmente dominados por homens reflete o resultado da luta feminina por reconhecimento e valorização. “Sou a única entre os fiscais. Para nós, ocupar cargos operacionais é uma experiência de grande relevância, pois abre portas para mulheres que, frequentemente, são subestimadas. Isso mostra que não buscamos igualdade, mas sim, equidade de direitos.”
Créditos de capa: Ascom/PMVC