“Ano Zero, uma história de 1945”: o mundo pós-guerra de Buruma

Em mais de 400 páginas, o historiador holandês conta os dramas vividos pela Europa e por outras regiões como o Oriente Médio e o Sudeste Asiático, após o fim da Segunda Guerra Mundial, em 1945 24 de novembro de 2019 Ricardo Santos

O livro “Ano Zero, uma história de 1945” descreve uma realidade diferente da representada em grande parte dos filmes norte-americanos sobre a 2ª Guerra Mundial. O historiador holandês, radicado nos Estados Unidos, Ian Buruma, revela que, com a derrota de Hitler e de seu estado de guerra, o otimismo que pairava no ar, que os Aliados queriam vender, na verdade, escamoteava um caos crescente pelo mundo.

“Ano Zero” é uma radiografia da vida privada e pública de várias nações logo após o término do conflito. Acompanhamos as implicações políticas, administrativas e econômicas que afetaram o rumo de países vitoriosos e derrotados por meio do cotidiano de sua gente. Em muitas passagens, vemos um retrato mais íntimo desses personagens históricos, na maioria pessoas comuns. Temos contato com comportamentos tanto nobres quanto sórdidos. Estupros, racismo, xenofobia, mas também a redefinição do papel da mulher, no ocidente e no oriente.

A 2ª Guerra Mundial afetou praticamente todos os povos do planeta, uns mais diretamente do que outros. “Ano Zero” dá a devida importância ao drama vivido não só pela Europa, palco principal do conflito, mas por outras regiões, como o Oriente Médio e o Sudeste Asiático. A 2ª Guerra foi o ápice de uma série de disputas políticas e econômicas, de um período de pelo menos um século, envolvendo potências europeias e suas colônias. No fim da guerra, houve um sentimento de alívio, tanto das autoridades internacionais como de populações massacradas, mas também foi o começo de tempos conturbados.

“Ano Zero, uma história de 1945”, de Ian Buruma, possui 472 páginas e foi publicado pela editora Companhia das Letras.

A Guerra Fria entre EUA e União Soviética se tornou evidente. As colônias europeias gritavam por independência. Aconteceram vinganças e retaliações, nem sempre justificáveis. A vida ainda era difícil para muita gente, e cada um se virava como podia, inclusive por meio da prostituição e do contrabando. Heróis de guerra foram traídos, presos e executados. Militares japoneses e nazistas e empresários simpatizantes do Eixo foram poupados para ajudar a reerguer a economia e a infra-estrutura da Europa e do Japão. A triste ironia da derrota do nazismo foi que abriram uma caixa de Pandora, que resultou na Guerra da Coreia e na divisão do país em Norte e Sul, na Guerra do Vietnã, na Guerra da Síria e em outros conflitos no século 20.

Buruma avalia que houve uma sincera vontade de muitos líderes, principalmente americanos e europeus, em aproveitar o fim da 2ª Guerra para promover uma reconstrução moral, com a criação da ONU, da Declaração Universal dos Direitos Humanos, do estado de bem-estar social e de instituições mais sólidas que garantissem uma nova era de prosperidade e fraternidade. Tudo isso acabou disputando espaço com a realidade, com o que há de pior no ser humano, tanto em relação aos poderosos quanto ao chamado cidadão comum, fora o fato de que povos oprimidos que não rezavam pela cartilha capitalista lutaram contra a visão liberal de novo mundo dos Aliados.

*Ricardo Santos é escritor, editor e servidor público. Nasceu em Salvador e é formado em Jornalismo pela Uesb. Ele possui um blog e seus contos foram publicados em sites, coletâneas e revistas, como Somnium e Trasgo. Organizou a coletânea Estranha Bahia (EX! Editora, 2016; 2ª edição 2019), finalista do prêmio Argos. Também é autor do romance juvenil Um Jardim de Maravilhas e Pesadelos (2015) e do livro de viagens Homem com Mochila (2018). Seu mais recente livro é a coletânea Cyberpunk (Draco, 2019). 

Imagem de capa: Pexels

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