O que esperar das artes cênicas de Conquista em 2020
Três espetáculos da cidade foram selecionados para o 4º Festival de Teatro do Interior da Bahia, o curso de Cinema da Uesb completa dez anos e surgem novos espaços e atividades que estimulam a produção cultural 24 de janeiro de 2020 Adriana AmorimDepois de alguns anos de muitos desafios, Vitória da Conquista inicia 2020 com boas perspectivas para a cultura em geral mas, sobretudo, para as artes cênicas. Desde a reabertura do Centro de Cultura Camillo de Jesus Lima, em julho de 2018, depois de um longo período de portas fechadas, muito tem sido feito em relação ao teatro e outras artes do palco. Soma-se a isso a intensificação de atividades formativas que tem sido oferecidas na cidade, além do aumento da produção teatral local associada à circulação de espetáculos de fora, sejam eles dos grandes centros ou das cidades vizinhas.
O ano de 2020 surge, pois, com alguns sinais de que este será especial. Vamos a eles. Neste ano, o curso de Cinema e Audiovisual da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (Uesb) completa 10 anos e a data será celebrada com uma série de atividades promovidas pelo Colegiado do curso. A primeira década serviu para estruturar as bases do que pretende vir a ser um pólo cinematográfico no Sudoeste da Bahia. Atividades diversas relacionadas ao ensino, pesquisa e extensão promovidas pelo curso têm potencializado a produção audiovisual da cidade e da região.
Os resultados já podem ser sentidos: produção de vídeoclips, documentários, obras ficcionais de curta, média e longa metragem já começam a percorrer circuitos nacionais e conquistar importantes prêmios e editais. E a produção cinematográfica, como sabemos, é uma indústria gigantesca que envolve muitos agentes, mesmo nas produções mais modestas. Nada se faz apenas com a comunidade interna da universidade, as produções integram artistas independentes ou coletivos, nas mais variadas funções técnicas e criativas.
Neste mesmo ano, o curso reedita o projeto “Cine em Cena” que em três edições anteriores envolveu mais de uma centena de atores e atrizes da cidade, numa experiência interdisciplinar entre o teatro e o cinema. Alguns dos novos atores e atrizes, que seguem uma bem sucedida carreira em seus grupos hoje, passaram pelos palcos do projeto entre os anos de 2016 e 2018. Este ano a expectativa é receber novos talentos, além de rever artistas que já experimentaram suas atividades. Na direção desse vasto elenco, estudantes da disciplina Direção de Atores vivenciam a desafiadora tarefa de reger um elenco numa obra de ficção.
Outro marco de 2020 é a abertura de novos espaços de formação e de circulação de espetáculos. Destaque especial para o Espaço Quixotesco da experiente companhia Operakata, coletivo que com uma brilhante trajetória nacional qualifica o teatro de Conquista, operando com o que há de mais atual e arrojado em pesquisa e produção estética. O espaço, além de uma sala de espetáculos bem equipada, dispõe de um espaço gourmet associado a outras experiências culturais, como uma biblioteca e um espaço para exposições de artes visuais (pinturas, fotografias e afins).
Duas características tornam o Espaço Quixotesco ainda mais valoroso: a primeira é sua localização. Invertendo o jogo sociogeográfico cruel que divide nossa cidade em lado leste e lado oeste, este maravilhoso espaço está localizado no Bairro Brasil, região que como o nome sugere, é um país em si. Escondido entre casas simples, em ruas largas e repletas de vida, o Espaço Quixotesco promoverá uma revolução não apenas cultural, mas social no ano de 2020.
Outro fator que torna este espaço uma verdadeira pérola preciosa em nossa cidade é a postura de seu grupo gestor. Unanimidade absoluta por onde passa com sua obra impecável, a Operakata é um coletivo que tem na gentileza, humanidade e delicadeza de seus membros (associados ao profissionalismo) uma marca indelével. Envolvidos sempre com questões fundamentais da sociedade, da cultura e da prática teatral, suas obras e suas iniciativas estão sempre comprometidas com a construção de um mundo melhor, para todas e todos.
Sim, o teatro de Conquista avança. E um sinal de que avança a passos largos no aumento da qualidade de sua produção é o resultado do edital que selecionou os espetáculos participantes da quarta edição do Festival de Teatro do Interior da Bahia. Dos 12 selecionados de todo o estado, três são da nossa cidade. Espetáculos que já fizeram bem sucedidas temporadas aqui em outras cidades e que agora levam para um público ainda maior o resultado de um trabalho intenso de pesquisa e criação.
Distintos em suas estéticas, os produtos representam a grande diversidade de nossos coletivos. Não é demais lembrar que dois destes grupos já venceram duas das três edições do prêmio Braskem de Melhor Espetáculo do Interior (Algaravias, O Marujeiro da Lua do Grupo Olaria – 2015 e Pariré da Operakata – 2017). O reconhecimento do trabalho que os coletivos Operakata, Olaria e Coletivo Poc realizaram em 2019 opera como importante estímulo para novos grupos e para que outros artistas da cena se sintam inspirados e confiantes em seguir na trajetória que anseiam, contrariando a ideia de que não há futuro para quem sonha com a carreira artística em nossa cidade.
Para encerrar a lista de sinais que indicam que 2020 será um grande ano para as artes cênicas em Conquista, boas notícias também na área de formação em teatro. Está confirmada a reedição do curso Técnico em Teatro oferecido pela Secretaria de Educação do Estado da Bahia, que acontecerá no Colégio Modelo Luiz Eduardo Magalhães e que no ano passado formou 12 novos técnicos em teatro.
Reafirmando-se como importante espaço de formação e articulação cultural, a CazAzul Teatro Escola intensifica suas oficinas e cursos livres, fortalece a ação de seus Núcleos (de Montagem Cênica e de Audiovisual), abre sua Biblioteca de Artes e Humanidades ao público e realiza mais uma edição do Curta Cuarta, evento que reúne artistas e apreciadores de diferentes linguagens artísticas, mobilizando sobretudo o público jovem.
Certamente há uma infinidade de outras iniciativas culturais e artísticas acontecendo em outros espaços, nos mais diversos bairros, promovidas por grupos que talvez ainda não sejam de nosso conhecimento. É certo que há muito a ser feito pela iniciativa pública e privada para que o trabalho destes coletivos todos possa ser reconhecido e valorizado. Arte também é profissão. Artistas precisam receber pelo que produzem.
Os artistas e o público de nossa cidade estão preparados para impulsionar a indústria criativa que ao redor do mundo tem alterado a direção do eixo migratório dos grandes centros para os interiores. É um movimento global e irreversível. Que os investidores locais possam estar atentos a essa tendência e possam fazer parte dessa revolução cultural, econômica e social.
Em ano de eleição municipal penso que quem se omitir em relação à cultura em suas propostas de governo, além de se mostrar alienado da própria realidade, deixará explícito que tipo de sociedade deseja ajudar a construir: uma sociedade empobrecida, sem arte e sem vistas ao futuro em vez de uma sociedade criativa, ousada, apoiada em ações culturais capazes de refletir sobre si mesma, enfrentar preconceitos de toda ordem, e construir novos tempos de democracia e equidade de direitos. Prepare-se, Vitória da Conquista, 2020 será um grande ano.
*Adriana Amorim é Doutora em Artes Cênicas pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). Professora Adjunta do Curso de Cinema e Audiovisual da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (Uesb). Atriz, Dramaturga e Diretora.
Foto de capa: Pixabay
Que lindo artigo, Adriana Amorim. Em tempos tão difíceis como os que vivemos, e numa cidade rodeada e gerida por negacionistas, esses exemplos citados por ti são fagulhas de esperança e motivos pra acreditar no futuro das Artes Cênicas no interior da Bahia. Obrigado a todos os coletivos e artistas de Conquista por existirem e resistirem a tudo isso.