Um novo ano, uma mesma pandemia
Entenda os dados da covid-19 e as várias interpretações possíveis para os números de mortes e a ocupação das Unidades de Terapias Intensivas (UTI's) 1 de fevereiro de 2021 Luan FerreiraTemos muitas formas de analisar os dados da covid-19. Os dados, divulgados diariamente, nos dão infinitas possibilidades de interpretação. Isso se justifica porque cada um acaba vendo os dados por aspectos diferentes. Isso não é ruim, mostra nossa pluralidade de interpretações.
Ao analisar dados temos sempre muito a ponderar. Por exemplo, no caso da covid-19 vários foram os dias em que a morte divulgada não aconteceu naquele dia, mas semanas ou até meses atrás, mas só agora se descobria a causa morte. Esse número divulgado um dia antes, um dia depois, provoca mudanças na análise.
Podemos observar nos números diários de pessoas que foram diagnosticadas com a doença a mesma situação. Aos finais de semana, a explicação que se dá é de que a força de trabalho diminui e, consequentemente, menos dados são processados.
Algumas métricas tentam ajustar essas oscilações de dados diários, como é o caso da média móvel. Soma-se os casos de sete dias, divide o total por sete e assim se chega a média diária de casos do período. Para saber se o número de hoje representa crescimento ou não dos casos, compara-se com a média de quatorze dias atrás (período em que se acredita que uma pessoa infectada já tenha se curado).
Hoje, 30 de janeiro de 2021, em Vitória da Conquista a média móvel de casos é 79. Um número que é 35% menor que o de 14 dias, quando a média era de 122 casos por dia. Ou seja, temos queda na média. Mas ao ouvir falar que estamos com queda na média, parece que essa boa notícia faz os olhos de muita gente se fecharem para o restante da situação.
Embora a média nos mostre uma queda neste período de observação, se a gente observa os dados do mês, vemos que janeiro é o mês de maior registro de casos desde março, quando foi registrado o primeiro caso de covid-19 em Conquista. Os casos deste mês, até este sábado, representam 17,55% dos casos confirmados até agora. Dezembro de 2020 tem a segunda maior porcentagem de casos, 16,25%. Os números divulgados amanhã podem mudar essa porcentagem, mas não o fato de que os números voltaram a crescer consideravelmente e são maiores que os do mês de agosto – que até o mês de novembro tinha sido o mês de maior registro de casos em Vitória da Conquista.
Mas essa não é a única forma de ver os casos de covid-19 na cidade. Se a gente soma os casos divulgados em cada mês e divide pelos dias desse mês, mais uma vez temos janeiro de 2021 como o mês de maior média: 102 casos por dia. Uma média maior de a do mês de dezembro (91), setembro (87) e agosto (90) que são os outros meses com maior registro de casos.
Hoje, tivemos o sétimo dia consecutivo de mortes divulgadas em Conquista. Foram 11 mortes neste período. No cenário de mortes do início da pandemia até agora, vimos que os idosos e pessoas com comorbidades não foram os únicos a perderem suas vidas para a covid. Essa doença levou jovens, levou pessoas consideradas de porte atlético, as pessoas sem nenhuma doença pré-existente.
Independente disso, a covid-19 levou o motivo de sorriso de muita gente, o abraço apertado que o pai dava nos filhos toda vez que voltava de uma viagem de trabalho.
Conversei com quem perdeu um parente pra covid-19. Falaram-me sobre vazio. Falaram sobre acordar no meio da noite e lembrar do sorriso da pessoa amada que se foi. “Minha irmã tinha o sorriso mais lindo do mundo e fazia todo mundo ao seu redor sorrir”, me contou uma dessas pessoas. Disse-me ainda que a irmã, antes de morrer, ainda internada por causa da covid-19, não deixava ninguém perder o otimismo.
Nossos costumes e tradições exigem uma despedida, um último adeus. É uma forma de fechar um ciclo, começar a restauração interior com as boas lembranças e aprendizados. A covid-19 nos tirou isso.
Neste mês de janeiro, até o dia 30, 42 pessoas partiram. Setembro de 2020 e janeiro são os meses com o segundo maior registro de morte do início da pandemia até agora. Ficam atrás apenas de agosto, que registrou 46 mortes.
A média de ocupação das UTIs exclusivas para covid-19 em janeiro é de 80,91% – a maior desde maio, quando esses números começaram a ser divulgados. Foi em dezembro que tivemos a retomada de números expressivos nas UTIs. Quase chegamos a 100% de ocupação em alguns dias. Em alguns hospitais, 100% de ocupação foi a realidade de muitos dias.
Não existem soluções mágicas, assim como ainda não existe remédio para essa doença. A vacina é, neste momento, o meio mais eficaz para nos vermos livres desse mal; ou pelos menos uma forma de nos deixar em situação mais controlada.
Aprendi com minha mãe que dor só sabe o tamanho quem sente. Penso que os números não são capazes de mensurar com exatidão toda a incerteza e dor causada pela pandemia, apesar de nos ajudar a enxergar uma realidade. Ao ver esse panorama de dados e informações sobre a covid-19, cabe a cada um uma interpretação e, mais do que isso, uma reflexão. Afinal, a pandemia atinge não apenas quem foi infectado pelo vírus da covid-19.
*Luan Ferreira é repórter da TV Sudoeste e colunista do site Avoador.