6ª Roda de Conversa do PET Saúde discute o cuidado da mulher trabalhadora do SUS durante a maternidade

O evento foi organizado pelo Grupo de Trabalho 5 - Eixo 3 - Valorização e Acolhimento às Diversidades no Processo de Maternagem 4 de dezembro de 2024 Por Rafaella Leite

A 6ª Roda de Conversa do PET-Saúde e Equidade abriu espaço para discutir as dificuldades enfrentadas por mulheres que equilibram a maternidade com a vida profissional. O evento realizado no Salão do Júri da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (Uesb), das 9h30 às 12h, do dia 30 de novembro, reuniu estudantes e professores com o  tema “De quem a gente descuida quando cuida”.

O evento foi um espaço de escuta e reflexões sobre direitos e políticas públicas voltados às mulheres, destacando os desafios cotidianos das mães que atuam no serviço público de saúde. Participaram do encontro a professora do curso de Medicina da Uesb e integrante do PET, Monalisa Barros; a especialista em Medicina de Família e Comunidade, Juliana Ataíde; a enfermeira e integrante do PET, Leila Meira; a também enfermeira Arianna Oliveira; e a professora do curso de Direito da Uesb, a advogada Luciana Silva e o comunicador Adão Albuquerque, que realizou uma apresentação artística na abertura das atividades.

Para Monalisa Barros, também organizadora do evento, os relatos de experiência das participantes  contribuíram para desconstruir a imposição social que exige que a mulher cuide de todos, muitas vezes negligenciando seu próprio autocuidado. “Todas as pessoas têm o direito de ser cuidadas, ouvidas e valorizadas. Transmitir esse conhecimento aos estudantes e à comunidade é essencial para construir uma sociedade mais justa, com redes de apoio, fortalecimento do papel das mulheres e criação de políticas públicas para o acolhimento e atendimento especializado das mulheres no SUS, incluindo as servidoras da saúde.”

Monalisa Barros aborda desafios e aprendizados da maternagem na vida acadêmica.

Monalisa mediou a mesa e iniciou a conversa compartilhando suas experiências como mãe. Ela revelou que passou por cinco gestações, das quais três filhos estão vivos e dois faleceram. Sua maternagem foi vivida simultaneamente com seu período de aprimoramento profissional, o que trouxe reflexões sobre suas escolhas ao longo dessa jornada. “Ao ver meus filhos sentirem saudades dos familiares que ficaram no Brasil durante minha viagem de mestrado à Inglaterra, me questionei se tinha o mesmo direito que outras pessoas de priorizar minha carreira e seguir em frente. Hoje, vejo que essa experiência proporcionou a eles uma liberdade de ir e vir, permitindo que estudassem em outros países e até morassem no exterior.”

Arianna Oliveira destaca as políticas públicas para gestantes nos municípios.

Já Arianna Oliveira destacou as políticas municipais disponíveis para as mulheres no SUS, mas apontou que ainda há lacunas a serem preenchidas, especialmente no que se refere à maternidade no contexto do trabalho para as servidoras da rede de saúde. “A mulher grávida usuária do SUS é assistida desde a atenção básica, com pré-natal, consultas e procedimentos. Existem programas como a Rede Cegonha e o Previne Brasil, do Ministério da Saúde, além de hospitais especializados e campanhas como o Maio Materno e o Agosto Dourado, mas ainda há a ausência de políticas que viabilizem o atendimento dos profissionais de saúde no local em que trabalham.”

Juliana Ataíde, mãe de um bebê de sete meses, deu seguimento ao encontro compartilhando os sentimentos e desafios que enfrentou com a chegada da maternidade. “Eu chorava de medo ao pensar em como seria após o nascimento do bebê. Quando ele nasceu, precisei fazer um aleitamento misto, e isso me causou um sentimento de culpa por não conseguir alimentar meu filho exclusivamente com o meu leite.”

Juliana Ataíde comenta sobre o retorno ao trabalho após a licença maternidade.

A médica ressaltou ainda que a necessidade de retornar ao trabalho após o fim da licença-maternidade foi uma mistura de emoções. “Por trabalhar em tantos lugares, foi muito difícil parar, mas depois de algum tempo em casa, eu olhava para mim mesma e tentava me encontrar, mas não conseguia mais. Hoje, ainda não retornei com todos os atendimentos e, ao encontrar alguns pacientes na rua, eles me perguntam quando vou voltar.”

Leila Meira, servidora do SUS há 26 anos e mãe de dois filhos, vive uma maternidade atípica. Ela disse que o momento mais desafiador foi descobrir que seu filho foi diagnosticado com Transtorno do Espectro Autista (TEA) em um período em que o tema ainda era pouco compreendido pela sociedade.

“Naquele momento eu comecei a imaginar como seria a vida dele. O TEA nível de suporte I muitas vezes passa despercebido, pois ele socializa, conversa, mas todos sabem que ele é diferente. O bullying velado acontece com o isolamento da criança: é quando dizem que ele é estranho, quando ele não é convidado para festas ou encontros. Esse sofrimento é vivido pela mãe junto com o filho.”

Leila Meira fala sobre os desafios da maternidade atípica.

Ao solicitar a redução de carga horária para acompanhar o filho, Leila teve o pedido negado devido à falta de políticas públicas para mães atípicas. “Quando ele foi crescendo, precisei acompanhá-lo em  terapias. No entanto, recebi menos acolhimento sobre suas necessidades dentro da universidade onde lecionava do que no hospital onde trabalhava. Existem políticas públicas voltadas para mães neurotípicas, mas nós, muitas vezes, somos excluídas desse direito e não somos compreendidas.”

Luciana Silva comentou sobre a Política Nacional do Cuidado e a economia do cuidado, temas que têm ganhado visibilidade com a nova gestão presidencial. Segundo ela, um relatório produzido para essa iniciativa revelou que 75% das pessoas envolvidas em atividades de cuidado, sejam remuneradas ou não, são mulheres.

Luciana Silva apresenta a política da economia do cuidado durante o evento.

Para Luciana, esse dado reflete o caráter patriarcal da sociedade. “A cultura machista nos impõe esse lugar no espaço privado, do trabalho doméstico e do cuidado, como se fossem exclusivamente coisas de mulher. O cuidado, no entanto, é um direito de todos. Essa política busca regulamentar as atividades de cuidado, reconhecer a importância dos cuidadores, redistribuir as responsabilidades de forma equitativa e garantir uma remuneração justa para aqueles que desempenham essas funções.”

O evento da 6ª Roda de Conversa, com o tema “De quem a gente descuida quando cuida?”, foi organizado pelo Grupo de Trabalho 5, Eixo 3 – Valorização e Acolhimento às Diversidades no Processo de Maternagem do Programa de Educação Tutorial (PET) Saúde e Equidade 2024, o qual participaram estudantes e professores da Uesb, Ufba e profissionais da saúde pública de Conquista.

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