Entenda porque junho se tornou o mês do orgulho LGBTQI+
No dia 28 de junho de 1969, policiais invadiram o bar Stonewall Inn, em Nova York, e a população LGBTQI+ resistiu transformando o movimento em um marco histórico na luta por direitos 28 de junho de 2020 Felipe RibeiroO mês de junho se tornou um período de celebração para a comunidade LGBTQI+ por causa de uma revolução ocorrida há 51 anos no bar Stonewall Inn, no East Village, em Nova York, nos Estados Unidos. No dia 28 de junho de 1969, policiais invadiram o estabelecimento que era frequentado por gays, travestis, drag queens e outras pessoas LGBTQI+ obrigadas a viver na clandestinidade. A polícia, alegando a fiscalização da venda de bebidas alcoólicas, agrediu e prendeu os clientes do bar nova-iorquino.
Na década de 60, mesmo com o surgimento de correntes que buscavam romper com o conservadorismo, como a contracultura e o movimento hippie, a homossexualidade ainda era considerada crime em quase todos os estados americanos. Em 1962, o estado de Illinois foi o primeiro a remover a proibição de seu código criminal.
A New York State Liquor Authority (Autoridade de Bebidas Alcoólicas do Estado de Nova York, em livre tradução), órgão responsável por controlar a fabricação e distribuição de bebidas alcoólicas, proibia a venda para a comunidade LGBTQI+. Por esse motivo, muitos estabelecimentos voltados para o público funcionavam de maneira clandestina. Essa era a realidade do Stonewall Inn, cujos donos pagavam propina aos policiais para garantir o funcionamento do local.
Em 28 de junho de 1969, data que se tornou o dia internacional do orgulho LGBTQI+, a batida policial ocorreu sem um aviso prévio, como costumava acontecer. Além de exigir a documentação dos presentes, os policiais abordavam homens vestidos com roupas consideradas femininas para checarem o sexo biológico de cada um. Quando as pessoas começaram a ser levadas paras as as viaturas de forma violenta, a população que se aglomerava na área externa do bar se revoltou e começou a atirar objetos na polícia.
Não se sabe ao certo quem iniciou a revolução, mas há rumores que a artista negra e lésbica Stormé DeLarverie teria dado o primeiro soco em um policial. Outros dois nomes envolvidos na revolta de Stonewall se destacam na história da luta pelos direitos da comunidade LGBTQI+. Marsha P. Johnson e Sylvia Rivera eram duas mulheres trans e responsáveis pela “Street Transvestite Action Revolutionaries”, uma instituição que ajudava pessoas trans em situação de vulnerabilidade.
Os manifestantes, além de zombarem dos policiais com danças e músicas, entoavam a frase “Gay Power” (Poder Gay). Mesmo com os reforços chamados pela polícia, a comunidade LGBTQI+ estava presente em maior número. Naquele dia de 1969, a revolta destruiu o Stonewall Inn mas, mesmo assim, na noite seguinte, as portas do bar se abriram e, mais uma vez, a comunidade LGBTQI+, reunida em mais de duas mil pessoas, fez-se presente para continuar o movimento de luta pelos seus direitos.
A polícia apareceu novamente e as cenas vistas no dia anterior se repetiram e seguiram por mais cinco noites. Não houve mortes, mas muitas pessoas ficaram feridas. Um ano depois do ocorrido foi realizada a primeira Parada do Orgulho LGBTQI+ dos Estados Unidos, em Nova York.
O bar Stonewall Inn continua existindo e foi tombado como patrimônio nacional. Por conta do enfraquecimento econômico gerado pela pandemia do novo coronavírus, o local corre risco de fechar as portas e pede ajuda para manter o seu funcionamento.
Dados sobre a violência
Em 2019, a Ilga (Associação Internacional de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Pessoas Trans e Intersexuais) publicou um relatório que mostrou que 70 países componentes da Organizações das Nações Unidas (ONU) ainda condenam a homossexualidade. Seis deles estabelecem pena de morte como punição: Arábia Saudita, Irã, Iêmen, Sudão, Nigéria e Somália. Entre os 70 países, 44% deles, o que representa 31 nações, condenam os gays a prisão com penas de oito anos. Além disso, 37% desses lugares impõem penas mais severas de até 10 anos ou prisão perpétua.
Um levantamento de 2019 feito pelo Grupo Gay da Bahia (GGB) mostra que a cada 26 horas ocorre a morte de uma pessoa LGBTQI+, seja por assassinato ou suicídio. Dessa forma, o Brasil torna-se o país recorde em crimes contra essas minorias.
Segundo o relatório do GGB, em 2019, casos de homicídios de pessoas LGBTQI+ foram identificados em todas as unidades federativas do país, tendo o estado de São Paulo ocupado o primeiro lugar de mortes violentas com o total de 50 vítimas.
De acordo com o boletim nº 02/2020 feito pela Antra (Associação Nacional de Travestis e Transexuais) sobre assassinatos de travestis e transexuais, em 2020, nos dois primeiros meses do ano, entre 1º de janeiro e 28 de fevereiro, houve um aumento de 90% dos casos em relação ao mesmo período do ano de 2019. O boletim mais recente de nº03/2020 apresenta que o país teve 89 assassinatos no primeiro semestre de 2020. Isso representa um aumento de 39% em comparação ao primeiro semestre de 2019.
Conquistas da comunidade LGBTQI+
Em 1° de março de 2018, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que pessoas trans podem mudar seus nomes nos cartórios sem precisar realizar a cirurgia de redesignação sexual. Essa medida é fundamental para esclarecer que nem toda pessoa trans deseja realizar a cirurgia e que o gênero nada tem a ver com o órgão genital. Além dessa decisão, foi estabelecido que a troca do nome pode ser realizada sem necessidade de decisão judicial.
Em junho do ano de 2019, mesmo período em que a Revolução de Stonewall completou 50 anos, o STF aprovou a criminalização da homofobia e transfobia. Com a aprovação, o crime é inserido na lei de racismo (Lei 7.716/1989) até que haja uma lei própria e pode levar à condenação de um até três anos de prisão, além de multa.
A mais recente conquista ocorreu em 8 de maio de 2020, quando, em reunião virtual, o STF determinou que homens gays podem doar sangue. A proibição, que vigorou até este ano, surgiu em 1993 por conta do desconhecimento a respeito do vírus do HIV. Até essa atual decisão, era preciso que os homossexuais estivessem a 12 meses sem ter relações sexuais com outros parceiros para que a doação pudesse ocorrer.
Foto de capa: Mercedes Mehling