O que é o “consórcio da morte” e por que ele persiste no Xingu
a alarmante e escancarada violência em Anapu e Altamira nos últimos 12 anos 4 de setembro de 2023 Julia DolceNo km 80 da Transamazônica, altura do Travessão do Flamingo, há um desnível perigoso, uma pequena colina no meio da estrada. O motorista vindo da cidade de Anapu, no Pará, não tem nenhuma visibilidade de quem vem do outro lado e, caso tente virar à esquerda em direção à vicinal Flamingo Sul, pode ser surpreendido por um automóvel em alta velocidade. Muitos acidentes já ocorreram nesse trecho.
A vicinal Flamingo Sul é o caminho para os lotes 96 e 97, atuais epicentros da violência agrária de Anapu, um dos municípios recordes em conflitos no campo nos últimos 12 anos, de acordo com os dados da Comissão Pastoral da Terra (CPT), sistematizados no Mapa de Conflitos da Agência Pública.
Ali, o fazendeiro Antônio Borges Peixoto reivindicou por anos uma área de cerca de 3 mil hectares ocupada desde 2011 por agricultores sem-terra. Após sua morte, em abril de 2022, um grupo de fazendeiros locais sustenta a mesma reivindicação do que virou um perigoso conflito, no qual os sem-terra já sofreram diversas ameaças de morte e tiveram casas, farinheira e escola rural incendiadas, situações já denunciadas em reportagens anteriores da Pública.
O trajeto pela estrada de terra que leva à área de conflito torna inevitável ao motorista não dar de cara com uma das sedes da fazenda Bom Jesus e Berrante, do finado Peixoto, guardada por dois carros de segurança privada. O detalhe da vigilância da fazenda torna refém os sem-terra e apoiadores da reforma agrária que por ali passam — como as irmãs Jane Dwyer e Katy Webster, integrantes da CPT e da Congregação de Notre Dame e sucessoras da luta de Dorothy Stang, assassinada em 2005.
Segundo as fontes ouvidas pela reportagem, a alarmante e escancarada violência no Xingu também é formada por detalhes como os trajetos monitorados, num enredo de medo e tensão que eles chamam de “consórcio da morte”, nome dado pelos movimentos campesinos ao grupo de fazendeiros mandante do assassinato da irmã Dorothy, que também estaria por trás dos conflitos atuais, como o dos lotes 96 e 97. O consórcio segue impune há quase 20 anos. Na boca do povo, muitos em Anapu sabem listar integrantes do grupo, mas a Justiça parece não conseguir nomear nenhum envolvido. Depois do caso Dorothy, em 2005, já tombaram outras 19 pessoas na luta pela reforma agrária em Anapu.
Da mesma forma, as vítimas têm dificuldade em nomear servidores públicos do sistema judiciário e da segurança pública da região. É comum que os servidores se afastem ou sejam afastados dos cargos, inclusive por corrupção. É o caso do último delegado da Delegacia Especializada de Conflitos Agrários (Deca) de Altamira, que abrange Anapu, Ivan Pinto da Silva. Investigado pelo Ministério Público, pela Corregedoria da Polícia Civil e pela Secretaria de Segurança Pública do Pará por causa da condução de pelo menos oito despejos ilegais contra famílias sem-terra.
O policial militar David* atua há mais de 30 anos na PM de Altamira, que abrange outros sete municípios da região, além de Anapu. Para ele, na zona rural dos municípios do Xingu, “a lei ainda é a do mais forte”. “Nunca existiu policiamento rural em Anapu, nem na época do assassinato de Dorothy nem agora. Não existe um batalhão ambiental nessa região aqui. Só atuamos quando o Ibama chama, mas não tem policiamento ordinário”, revela. Distritos inteiros de Altamira, maior município do país em extensão territorial, não possuem policiamento.
A Pública cruzou os dados do Mapa dos Conflitos com diferentes bancos de dados públicos. Municípios xinguanos, como Anapu, Altamira e São Félix do Xingu, se destacam por, nos últimos 12 anos, liderar o número de conflitos no campo (foram 177 em Anapu e 403 em Altamira, entre 2009 e 2022), pelos altos índices de violência (calculados por meio do número de pessoas internadas no SUS por agressão) e pela alta desigualdade social.
Anapu ocupou um dos últimos lugares no Índice de Progresso Social (IPS) da Amazônia em 2021. Dos 772 municípios da Amazônia Legal, ficou em 702º lugar. Em relação especificamente ao critério de segurança pessoal, Anapu ocupa a 747a posição. Já Altamira ocupa a 509a posição nas classificação geral do ranking, mas quando se trata de segurança pessoal e inclusão social, o município cai, respectivamente, para a 755a e a 723a posição.
A relação entre conflitos agrários e dados de violência, segundo o relatório “Cartografia das Violências na Região Amazônica”, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), aponta que os municípios com maiores taxas de mortes violentas intencionais em 2020 são os classificados como sob pressão de desmatamento — 37,1 por 100 mil habitantes. O relatório mostra também que, dos seis estados brasileiros com menores efetivos policiais, quatro estão na Amazônia.
Outro relatório, “Governança e Capacidades Institucionais da Segurança Pública na Amazônia”, publicado pelo FBSP e pelo Instituto Igarapé, mostra que, enquanto a média brasileira de território coberto por ao menos um policial civil é de 93 km², na Amazônia cada policial é responsável por área quatro vezes maior (428 km²).
Segundo Aiala Colares Couto, doutor em geografia, pesquisador da Universidade do Estado do Pará (Uepa) e membro do FBSP, grande parte dos territórios desses municípios pertence à União, sendo destinados às unidades de conservação ou terras indígenas. Essas áreas, palco de conflitos, dependem da segurança de órgãos federais como o Ibama, as Forças Armadas e a Polícia Federal. “Nos últimos anos, esses serviços foram sendo precarizados, as ações diminuíram, e isso dá condições para milícias armadas no campo”, afirma.
Já nas parcelas de território em que cabe ao estado e municípios atuarem, existe uma grande defasagem de segurança pública, o que colabora para um quadro alarmante, alerta Couto. Segundo ele, seguranças e milícias contratadas por empresas que praticam crime ambiental teriam efetivo superior ao de policiais do município. “Quem vai se organizar para comprar armas são justamente os mesmos grupos que detêm o poder da exploração de ouro, de madeira, ou de terra grilada”, diz.
Assim, em municípios marcados pela ausência do Estado, empresas de extração predatória detêm poder de fogo, portando arsenais que foram legalizados pelo governo Jair Bolsonaro e que ostentam até mesmo empresas profissionais de segurança patrimonial.
Duas fontes que pediram anonimato afirmaram à Pública que fazendeiros de Anapu e região teriam se reunido em eventos e gravado vídeos ostentando armas durante a gestão de Jair Bolsonaro. “Eles ganharam muito mais confiança e podem mostrar as armas porque elas estão legalizadas”, afirma uma delas.
Fazer dano — o pecado original
“Fazer dano” era a expressão utilizada antigamente no Xingu para matar. No livro Terror e resistência no Xingu, doutorado da antropóloga Ana de Francesco, ela registra a banalidade da violência nos primórdios dos conflitos territoriais na região. Nas primeiras décadas do século 20, o Xingu recebia sua primeira onda de colonização, os seringueiros, chamados de pioneiros. Na época, centenas de milhares de hectares de floresta foram divididos entre poucos empresários, que importaram mão de obra de outras regiões do país.
Foi a primeira vez que o Estado fechou os olhos para a existência da população local e, sob o falso pressuposto de um vazio demográfico, privatizou enormes porções de terra com gente dentro. No caso, povos indígenas. Eles reagiram, matando inúmeros seringueiros, e estes vingaram as mortes, matando inúmeros indígenas. O “dano” só foi um problema quando atingiu a produção de borracha, o fabrico. E, só quando atingiu a produção, o Estado reagiu, enviando a primeira tentativa de “segurança pública” para o Xingu. Sertanistas, função que precedeu o indigenismo, foram chamados para dialogar com os indígenas e propor trégua e convivência.
“Ou doma os índios, ou libera para a gente passar um verão sem trabalhar, só matando índio, para poder trabalhar depois”, ouviu a antropóloga de um dos ribeirinhos entrevistados, Sabá Bacabeira, cujo pai chegou do Ceará com 11 anos, em 1912, pra trabalhar para o seringalista José Porfírio na região do Riozinho do Anfrísio, em Altamira.
Três décadas depois, durante a ditadura militar, a região sofreu a segunda onda colonizadora, com a abertura da Transamazônica, a BR-230. “O inferno verde já era”, ou “chega de lendas, vamos faturar” estavam entre as propagandas da estrada. Uma lenda que permaneceu, no entanto, foi a do vazio demográfico. “Uma terra sem povo para um povo sem terra” era um dos principais slogans da colonização nas margens da rodovia.
Colonos de todo o país se mudaram para a região, principalmente famílias sem-terra nordestinas e famílias de agricultores sulistas que buscavam enriquecer. O governo estabeleceu os Contratos de Alienação de Terras Públicas (CATP), por meios dos quais grandes lotes de terra foram entregues a empresários do agronegócio, com financiamento da Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (Sudam). Muitos deles nunca pisaram na região, deixando de cumprir a principal exigência dos contratos, a produtividade da terra em até cinco anos. Diante do descumprimento, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) recuperou grande parte das terras, destinando-as para a reforma agrária.
A partir dos anos 1990, no entanto, cresceu o interesse econômico pela região, principalmente por conta do boom madeireiro. Com a Transamazônica pronta, e a infraestrutura sendo criada ao seu redor, herdeiros dos empresários contemplados pelos CATPs chegaram à região reivindicando suas propriedades. Encontraram terras já ocupadas por pequenos agricultores e as grilaram. A pistolagem se tornou regra, e assim foram instalados conflitos agrários até hoje não resolvidos.
A terceira fase de colonização da região complementou o caos fundiário. A construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte entre 2010 e 2016, deslocou de seu território centenas de famílias ribeirinhas, descendentes de indígenas e dos pioneiros seringalistas. As famílias foram realocadas nos Reassentamentos Urbanos Coletivos (RUCs), bairros planejados na periferia de Altamira. Em dois anos, entre 2011 e 2013, a população do município dobrou com os trabalhadores da obra. Foram anos em que a prostituição e a dependência química reinaram. Facções de narcotráfico se instalaram em Altamira, e o município passou a liderar índices de violência.
Com o fim da obra, cerca de 19 mil trabalhadores ficaram desempregados. Em 2015, a taxa de desemprego de Altamira era uma das mais altas do país. Parte dos trabalhadores foi procurar terras para trabalhar na região e acabaram se somando nas ocupações em terras destinadas à reforma agrária que sofrem com os conflitos. Parte ficou na cidade, se mudando para os RUCs. A região nunca mais foi a mesma. Os danos nunca foram recuperados.
Os índices de violência refletem a construção de Belo Monte
Entre 2020 e 2021, durante os meses mais severos da pandemia de Covid-19, ribeirinhos que vivem nas unidades de conservação de Altamira doaram centenas de alimentos em cestas básicas para os ribeirinhos reassentados nos RUCs. Com o isolamento social, famílias inteiras que já haviam sofrido um impacto profundo em seu modo de vida, entraram em insegurança alimentar.
Raimunda Rodrigues, ribeirinha da comunidade Rio Novo, na Reserva Extrativista Rio Iriri, participou da iniciativa. “Enviamos farinha de mandioca, tapioca, castanha, abóbora, melancia, óleo de babaçu. Eles ficaram felizes. O pessoal sente falta de plantar”, conta.
A principal renda dos ribeirinhos era a pesca. Com a expulsão para a operação de Belo Monte, que alagou parte das terras onde viviam, a renda foi reduzida, e os gastos aumentaram. Agora, pagam contas de energia, gás, transporte público. Localizados em periferias distantes do rio Xingu, não podem deixar suas voadeiras sozinhas no cais, porque são roubadas. Então pagam R$ 20 por dia para vigias cuidarem dos barcos na beira do rio, ou pagam o transporte para as embarcações. Em último caso, apenas as aposentam, deixando-as no quintal da casa planejada.
Foi o destino da voadeira de Raimundo Braga Gomes, conhecido como Raimundo Berro Grosso, que vive hoje no RUC Jatobá. Ele foi expulso do local onde vivia, nas margens do rio Xingu, em 2016. “Tacaram fogo na minha casa com tudo dentro. Não me indenizaram um centavo até agora”, denuncia. Raimundo faz parte do Conselho Ribeirinho, organização criada para negociar a volta das famílias ao rio, por meio da criação de um “Território Ribeirinho”.
Os RUCs hoje estão mais personalizados. Algumas casas têm barcos encostados na lateral, como a de Raimundo, outras têm pinturas de florestas nas paredes. Algumas são cercadas pela sombra de árvores que já foram mudas transplantadas dos antigos locais onde as famílias viviam. Um padrão cada vez mais comum e que não fazia parte do projeto inicial dos RUCs são as grades nas portas e janelas. Em muitos casos, não se vê mais casa alguma, apenas muros altos cobertos por cerca elétrica e adesivos de segurança monitorada.
Os RUCs são considerados as áreas mais perigosas de uma Altamira que, em 2017, ganhou o título de cidade mais violenta do país, de acordo com o Atlas da Violência, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Em 2023, Altamira ocupou o sétimo lugar no ranking de municípios mais violentos do Anuário Brasileiro de Segurança Pública. Para os altamirenses, é unanimidade que os índices de violência refletem a construção de Belo Monte. Já a construção dos RUCs reflete a negligência com a população local.
Em uma das visitas ao RUC Jatobá, conhecido como “Jatobala”, a reportagem cruzou com uma equipe de construção reparando uma casa. São os “vícios construtivos”, informou a engenheira responsável pela obra, contratada por uma empresa terceirizada pela Norte Energia, concessionária de Belo Monte, para reduzir os “danos causados”. “As casas foram construídas muito rápido, e isso influenciou um pouco na qualidade. Hoje elas apresentam trincas nas paredes, lajotas desniveladas, rachaduras. Às vezes não chega energia ou tem que trocar a caixa-d’água”, listou.
Alguns dos vícios construtivos não são mais resolvidos pela concessionária, tendo passado para a competência da prefeitura. É o caso de problemas de água ou esgoto. Nos RUCs, outdoors informam o número do “zap da Prefeitura” para tal serviço. A informação é acompanhada pela ilustração de uma mulher indígena, com duas penas no cabelo, segurando um celular, além do brasão da prefeitura, com o slogan “mais vida, mais futuro!”. Altamira não tem cuidado de seu futuro. O município é um dos que mais matam jovens no país.
Vitoriano Bill vive na periferia de Altamira, é professor de matemática e mestrando em geografia na Universidade Federal do Pará (Ufpa), onde pesquisa a violência no contexto de Belo Monte. Segundo Bill, os índices de violência apontam os jovens como principais vítimas de homicídios em Altamira. Assim que a barragem foi construída, os assassinatos eram diários. “Antes a cidade ficava de luto, mas chegou um momento em que ninguém ficava mais”, afirma Bill.
Bill é fundador do Sarau Marginal, evento cultural criado como resposta à ausência de lazer para a juventude periférica altamirense. As principais poesias apresentadas no sarau, ao longo dos anos, têm como temática a violência do município. Segundo o professor, a última chacina que mobilizou a população foi a que matou Magid Elias Mauad França.
Magid era estudante de geografia e foi assassinado em 2 de outubro de 2017 no RUC São Joaquim, local onde vivia o primo de um amigo, para quem ele estava dando carona. Magid, o amigo e o primo foram alvejados por traficantes que confundiram a casa onde estavam com a casa vizinha, onde vivia a namorada de um traficante da facção rival. “Confundiram porque as casas dos RUCs eram todas iguais”, afirma a mãe de Magid, Málaque Mauad Soberay.
Após o assassinato do filho, Málaque fundou o movimento Mães do Xingu, formado por mães de vítimas da violência de Altamira, e se tornou uma das principais referências na luta por segurança pública na região. “Desde que vi o corpo do meu filho caído, não parei um minuto. No dia seguinte, já estava em reunião. Era uma fala e um choro.”
As Mães do Xingu participaram da fundação do Fórum Regional de Segurança Pública, da qual Málaque foi presidente. Elas foram responsáveis pelo aumento do efetivo policial e por criar a Patrulha Maria da Penha em Altamira. “Tudo que conquistamos em Altamira hoje alguém teve que morrer para que acontecesse”, resume a fundadora do Mães do Xingu.
“O que adianta aumentar a força policial se não tem políticas públicas?”
Para Málaque, a barragem “mudou tudo” e, a partir dela, faltou tudo também. “Altamira era uma cidade pacata. Quem se organizou foi o tráfico. Nada mais era nosso, tudo era deles.” Segundo as Mães do Xingu, enquanto os condomínios onde vivem os engenheiros da Norte Energia têm guaritas de segurança privada, Altamira ainda vive uma luta pela implantação de segurança pública.
O policial militar David* acompanhou de perto as mudanças na segurança pública de Altamira. Quando iniciou sua carreira, ainda na década de 1980, Altamira tinha apenas uma delegacia, duas viaturas, e uma média de 25 presos. Embora o efetivo tenha aumentado depois de Belo Monte, ele questiona sua efetividade.
“A barragem foi uma violação, tenho certeza que foi a causa da violência. Faltou educação, saúde, geração de emprego. Dos cinco RUCs, apenas um tem escola de ensino médio. O que adianta aumentar a força policial se não tem políticas públicas?”, pondera.
Um dos episódios mais emblemáticos da violência na região foi o massacre no Centro de Recuperação Regional de Altamira, até então único presídio do município. Em 29 de julho de 2019, 62 pessoas foram assassinadas, parte por asfixia, parte decapitada. O massacre teria sido resultado de uma briga entre o Comando Classe A, filial do PCC na região, e o Comando Vermelho.
O presídio estava superlotado. Onde cabiam 200 pessoas, os documentos mostraram que mais de 300 dividiam celas. O padre Patrick Francis Brennan, que atua na Pastoral Carcerária e tinha visita marcada no presídio no dia do massacre, afirma que, apesar do dado apresentado nos documentos, há relatos de que cerca de 500 pessoas estavam presas no centro.
“Quando chegamos, já vimos a fumaça saindo do presídio. Não foi possível identificar muitos corpos de tão queimados”, lembra. Segundo Patrick, a Pastoral Carcerária já tinha avisado a diretoria do presídio sobre a possibilidade de uma rebelião devido à superlotação, mas nenhuma providência foi tomada.
O massacre ocorreu quatro meses antes da inauguração do Complexo Penitenciário de Vitória do Xingu, presídio de segurança máxima construído com financiamento da Norte Energia como condicionante de Belo Monte. O padre Patrick visita o Complexo uma vez por semana. “Não podemos nem dar a mão ou falar com os presos. Quando a gente chega, está todo mundo no chão com os braços pra trás. Ficam horas assim, sem poder mexer”, revela.
Patrick afirma ter se encontrado com um egresso em novembro de 2022 e recebido relatos de torturas. “Ele contou que duas pessoas cometeram suícidio por conta dos maus-tratos.” Segundo o padre, a maior parte dos presidiários é jovem e moradora dos RUCs, e cerca de 70% estão presos por tráfico de drogas.
Enquanto parte de uma juventude que cresceu sem oportunidades é encarcerada, a impunidade do “consórcio da morte” e demais empresas por trás das organizações criminosas segue deixando vítimas, e o Estado segue confessando sua ineficiência. Hoje são mais de 90 defensores e defensoras de direitos humanos e meio ambiente no Pará inseridos em programas federais de proteção de ativistas.
Para o pesquisador Aiala Colares Couto, a violência e os conflitos na Amazônia ganharam novas complexidades, abastecidos pelo comércio de armas e cada vez mais articulados com o narcotráfico e a lavagem de dinheiro. “Por isso, é fundamental a integração entre as forças de segurança pública, um pacto federativo entre as polícias, o Ibama, e a regularização de terras e, principalmente, a criação de modelos econômicos sustentáveis para dar oportunidades às pessoas dessas regiões.”
Reportagem republicada da Agencia Publica de Jornalismo Investigativo em pareceria com o Site Avoador