Vereadores da oposição não conseguem avanços na CPI da saúde e são boicotados na Comissão de Fiscalização da Prefeitura de Conquista
Presidente da Câmara Hermínio Oliveira (PP), e a Mesa Diretora enviaram um documento proibindo o uso do plenário pela Comissão 21 de novembro de 2024 Kamile CardosoNesta quinta-feira (21/11), estava prevista a realização da Comissão de Fiscalização dos Atos Executivos da Câmara Municipal de Vitória da Conquista, presidida pela vereadora Márcia Viviane (PT), com a participação do vereador Alexandre Xandó (PT). Durante a sessão, seriam ouvidos os depoimentos do ex-procurador Edmundo Ribeiro Neto e da presidenta do Conselho Municipal de Saúde, Tereza Moraes, sobre suspeitas de corrupção na saúde pública. No entanto, na tarde do dia 20/11, o Presidente da Câmara, Hermínio Oliveira (PP), e a Mesa Diretora enviaram um documento proibindo o uso do plenário. Os depoimentos estão interligados às investigações da CPI da Saúde, que apura fraudes e superfaturamento em contratos da Secretaria Municipal de Saúde durante a pandemia de Covid-19.
O plenário da Câmara foi solicitado desde o dia 12 de novembro para a realização das oitivas (ato de ouvir testemunhas, acusados ou outros envolvidos em um processo). Diante da suspensão, os vereadores Alexandre Xandó e Márcia Viviane, ambos integrantes da Comissão da CPI da Saúde, decidiram dar sequência às oitivas no gabinete 302, como um ato da bancada de oposição.
Desde o dia 23 de outubro, a Câmara Municipal de Conquista instalou a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar alegações de corrupção, manipulação de processos licitatórios e direcionamento de compras na Secretaria Municipal de Saúde durante o auge da Covid-19, em 2020. O prejuízo é estimado em R$677 mil aos cofres públicos. Embora a CPI tenha começado, os trabalhos seguem a passos lentos, e têm até dezembro para concluir as investigações, baseadas nas denúncias originadas pela Operação Dropout, deflagrada pela Polícia Federal.
“Desde maio, o presidente da Câmara literalmente sentou em cima da CPI. Judicializamos em junho, mas o Judiciário demorou muito para decidir, e a resposta só veio agora, em outubro. Então, temos um prazo apertado, pois a CPI precisa ocorrer dentro desta legislatura, que termina no final do ano”, disse o vereador de oposição e um dos principais defensores da CPI, Alexandre Xandó (PT). “Após a decisão judicial, houve uma intimação na Câmara direcionada à secretária do presidente, o que foi usado pelo procurador da Casa para argumentar que o presidente não havia sido formalmente notificado. Apesar disso, vamos seguir com os trabalhos, mesmo diante das obstruções que prejudicaram o andamento. ”
Alexandre Xandó (PT), em entrevista à Rádio Up, explicou ainda que a CPI não busca duplicar o trabalho da Polícia Federal, mas investigar as ações da administração municipal diante das acusações. “A CPI é essencial para garantir transparência e responsabilidade na administração pública, especialmente no contexto da pandemia, que demandava uma gestão exemplar.
A solicitação para ouvir as testemunhas pela CPI havia sido inicialmente aprovada, mas o presidente da CPI, Chico Estrella, impôs que os depoimentos fossem sigilosos. Próximo à data marcada para as oitivas, Estrella convocou uma reunião extraordinária via WhatsApp, sem formalização oficial, e, junto ao relator Edjaime Bibia (União Brasil), decidiu cancelar os depoimentos.
O presidente da CPI, Chico Estrella, afirmou que a Comissão deve agir com responsabilidade e conforme a lei. “Não tem como praticar atos de forma assoberbada, para atender aos anseios políticos de uma oposição sedenta por carniça em meio ao vale, sem mensurar o quão custoso estas ações serão para a população de Conquista. Precisamos ter responsabilidade e praticar os atos conforme determina a lei”, declarou.
Estrella também criticou as acusações de boicote, considerando-as desleais. “Interessante questionar a pessoa que se manifestou sobre os supostos embargos praticados pela Comissão no sentido de boicotar as ações da CPI o porquê de não ter buscado maiores e melhores informações diretamente com os membros que compõem a comissão, preferindo apontar à imprensa ilações inverídicas de forma desleal e irresponsável”, disse.
O vereador do PDT ainda afirmou “Uma CPI não pode ser usada para fazer politicagem baixa e rasteira, tentando macular a imagem de quem quer que seja, senão a dos envolvidos no processo. Buscam a todo custo imputar à gestora, que nada tem a ver com o processo, a culpa, simplesmente por querelas políticas e ideologias contrárias, concluiu.
Já o vereador Alexandre Xandó, em entrevista ao Blog do Sena, afirmou “Censura, abuso de autoridade e autoritarismo! Porque eles têm tanto medo desses depoimentos? Essa é a primeira vez que eu vejo um presidente da Câmara impedindo que vereadores cumpram sua obrigação legal de fiscalizar o executivo.” Por sua vez, a vereadora Márcia Viviane declarou “Os vereadores da prefeita não deixam a CPI andar, estão obstruindo os trabalhos e agora querem derrubar a comissão para a qual fomos eleitos. Mas nós somos vereadores eleitos e reeleitos, e temos a prerrogativa de colher denúncias de mau uso do dinheiro público. Por isso, vamos manter a oitiva e não seremos impedidos de forma alguma.”
Contexto
Em 2020, em meio à pandemia do coronavírus, o governo federal propôs aos municípios fazer compras sem licitação para acelerar o acesso aos medicamentos. Conquista não foi exceção, a cidade precisou fazer aquisições emergenciais de testes rápidos para detectar o vírus, utilizando tecnologias como fluorescência e imunocromatografia. O processo de aquisição levantou suspeitas de superfaturamento, com um total de R$2.030.000,00 destinados a dois contratos, que, conforme as investigações, foram manipulados para beneficiar uma empresa específica. O site Sudoeste Digital fez a primeira denúncia ainda em 2020.
Na análise da Controladoria-Geral da União (CGU), o processo de dispensa de licitação foi direcionado para beneficiar uma empresa em particular, que apresentou uma proposta superior às demais, apesar de outras ofertas mais vantajosas. Em um dos contratos, propostas mais baratas para testes de imunocromatografia foram rejeitadas sem justificativa, enquanto a empresa investigada forneceu testes de fluorescência a um preço considerado elevado em comparação ao mercado.
Posteriormente, a mesma empresa foi contratada novamente para fornecer testes de imunocromatografia, com uma proposta que se aproximava do valor da primeira compra. Isso resultou em um superfaturamento de R$677.600,00, conforme apurado pela Polícia Federal, que abriu investigação sobre o caso no âmbito da Operação Dropout.
Abertura da CPI e o papel da Câmara Municipal
A solicitação para a criação da CPI foi feita por oito vereadores da oposição Alexandre Xandó (PT), Fernando Jacaré (PT), Viviane Sampaio (PT), Valdemir Dias (PT), Delegado Marcus Vinícius (PODE), Lúcia Rocha (MDB), Augusto Cândido (MDB) e Andreson Ribeiro (PCdoB), que protocolaram o requerimento na Câmara Municipal em maio de 2024. O pedido teve o apoio de mais de um terço dos parlamentares, conforme estipulado pelo Artigo 29 da Lei Orgânica do município.
Inicialmente, a abertura da CPI foi bloqueada pelo presidente da Câmara, Hermínio Oliveira (PP), que alegou falta de fatos específicos para justificar a investigação. Contudo, um mandado de segurança impetrado pelos vereadores resultou em uma decisão judicial favorável, que determinou a instalação da CPI no prazo de cinco dias úteis, sob pena de multa diária de R$20.000,00, podendo chegar a R$200.000,00.
Segundo requerimento de instauração da CPI, a investigação não é apenas para averiguar as investigações das fraudes nos contratos de compra, mas também examinar a possível omissão da Prefeitura na gestão das denúncias de corrupção. Os vereadores questionam por que a administração municipal não tomou medidas mais enérgicas diante das acusações, especialmente considerando que a ex-secretária de Saúde, Ramona Cerqueira, e outros servidores permaneceram em seus cargos durante e após as investigações da Polícia Federal. A ex-secretária só deixou o cargo em fevereiro de 2023, quando pediu demissão.
A instalação da CPI gerou ampla repercussão no cenário político. Enquanto a oposição defende que a comissão é essencial para esclarecer os fatos e responsabilizar os envolvidos, a bancada governista, formada pelos vereadores Luís Carlos Dudé, Adinilson Pereira, Edjaime Rosa e Diogo Azevedo do União Brasil argumenta que a Prefeitura de Vitória da Conquista já tem colaborado ativamente com as investigações conduzidas pela Polícia Federal.
Operação Dropout
Durante a operação, realizada no dia 25 de abril de 2024, a Polícia Federal cumpriu mandados de busca e apreensão na Secretaria Municipal de Saúde de Vitória da Conquista, e realizou apreensões em Salvador e Belo Horizonte, incluindo dinheiro em espécie e carros de luxo. A operação revelou que, por meio de dispensa de licitação, a Prefeitura direcionou a compra de testes para uma empresa de Belo Horizonte, ligada a um dos servidores da Secretaria.
O delegado da Polícia Federal, Rodrigo Kolbe, responsável pela Operação Dropout, informou em coletiva de imprensa que o superfaturamento foi possível devido à autonomia financeira e administrativa da Secretaria de Saúde na época, o que facilitou as manobras ilegais. Como resultado, a ex-diretora de Vigilância Sanitária, Ana Maria Ferraz de Oliveira, e outros servidores foram afastados de seus cargos, incluindo a ex-secretária Ramona Cerqueira, que não tem mais vínculo com a Prefeitura.
Andamento da CPI
A CPI tem um prazo de 90 dias para concluir suas investigações, com foco na apuração das irregularidades nos contratos de aquisição dos testes de covid-19 e na análise da possível omissão da gestão municipal. O vereador Francisco Estrela Dantas Filho (PDT) foi escolhido para presidir a comissão.
Em entrevista à Rádio Clube de Conquista, divulgada no Blog do Anderson, o presidente da CPI, Francisco Estrela Dantas Filho (PDT), afirmou que os trabalhos da comissão já começaram. O parlamentar destacou que a comissão iniciou a convocação de testemunhas e outras providências para dar seguimento à investigação. Ele também enfatizou a necessidade de respeitar o segredo de justiça da investigação da Polícia Federal.
“Já começamos a tomar providências, como intimar algumas pessoas, para dar efetivamente prosseguimento à CPI. Estamos realizando uma CPI, mas já existe uma investigação em curso pela Polícia Federal, uma das instituições de maior credibilidade do país. Precisamos tomar muito cuidado para que nossa apuração não interfira no trabalho da Polícia Federal”, explicou Chico Estrela.
A comissão se concentrará em investigar como os responsáveis pela administração pública lidaram com as acusações feitas à época, já que a gestão de Sheila Lemos, atual prefeita, foi mantida sem consequências significativas para os envolvidos, mesmo após o início das investigações da Polícia Federal.
Segundo o administrador público, Geivison dos Santos, qualquer prática que restrinja a livre concorrência ou envolva a apresentação de documentação falsa para manipular disputas de preços e prazos configura uma fraude em licitação. “Esses atos buscam atender a interesses pessoais e causam prejuízos ao poder público, sendo regulados pela Lei nº 14.133/2021, que estabelece diretrizes claras para os processos licitatórios”, detalhou. Ele ressaltou ainda que a transparência nos portais públicos é essencial para que a sociedade e os órgãos fiscalizadores possam identificar falhas e denunciar irregularidades.
O especialista ainda pontuou que o processo licitatório depende diretamente da conduta do agente público, que deve se basear nos princípios de legalidade, impessoalidade e publicidade para garantir legitimidade.
As Comissões Parlamentares de Inquérito, como a que está em andamento na cidade, têm um papel essencial no combate às irregularidades. “Elas não aplicam sanções, mas contribuem com o poder judiciário ao recolher depoimentos, requisitar documentos e construir os autos do processo”, destacou Geivison.
No caso específico de Vitória da Conquista, o superfaturamento de R$677.000,00 compromete diretamente a entrega de serviços essenciais, atrasando a efetividade das ações de saúde pública. “O principal efeito é o retardamento do bom andamento da máquina pública, gerando desconfiança nas instituições. Contudo, a atuação rigorosa dos órgãos fiscalizadores têm inibido essas práticas e permitido ajustes mais rápidos.”
Ele também reforçou que a administração pública deve responder prontamente às denúncias, instaurando processos investigativos para apurar responsabilidades. “Os agentes públicos e fornecedores envolvidos podem ser responsabilizados, e as punições variam conforme a gravidade dos atos cometidos”, disse Geivison.