As faces do machismo na universidade
17 de novembro de 2020A violência contra mulher também faz parte do ambiente universitário. Essa é a constatação da pesquisa realizada em 2015 pelo Instituto Avon em parceria com o Data Popular, quando 52% disseram ter sofrido agressão moral/psicológica e 56% delas assédio sexual. Viviane, aluna de um dos cursos de exatas da Uesb, é uma dessas
vítimas. Ela já sofreu comentários machistas e a assédio sexual em sala de aula.
“A maior parte dos professores são homens, então acaba tendo piadinhas durante a aula. Isso acontece também porque os alunos acham a maior graça. Existe uma plateia e o professor tem mais um motivo para brincar e assediar. Ele se sente no direito por ser
professor e estar comandando a turma. São piadas do tipo: pegar alunas, ditar a forma
que ela tem que se vestir para passar na disciplina”, diz Viviane.
Aline, a aluna do curso de Agronomia, também vivenciou algo semelhante. Ela
escutou de um professor que “não contrataria mulher nenhuma porque mulher tem que
cuidar de casa e ainda dão prejuízo por conta da licença maternidade”. Segundo a
estudante, a experiência chocou. “Ouvir de um professor, que deveria impulsionar o
estímulo na carreira, que não seria uma opção de contratação foi desestimulante.” Ela
diz ainda que percebeu esse tipo de atitude de professores mais velhos. O
constrangimento vivido pela discente de Agronomia se enquadra na violência contra
mulher, como agressão moral, que, nesse caso, se exemplifica pelos comentários
machistas do professor.
As vítimas dessa reportagem, Marina e Viviane, são nomes fictícios. Elas não
foram identificadas para evitar exposição. Esse fato é importante ser ressaltado, pois as
vítimas que revelam nomes abertamente, muitas vezes, sofrem perseguição pelos
agressores e até do público. O apoio às vítimas ainda é reduzido. Na Uesb, as próprias
estudantes se organizaram para dar voz aos casos de machismo na universidade. A
coordenadora de Cultura e Eventos do DCE, Géssica Emanuele, faz parte desse
movimento. Ela destaca um caso que aconteceu no ano passado, e foi acompanhado de
perto pelo DCE, em que um professor do Departamento de Licenciatura assediava
alunas. A partir dessa denuncia e do apoio de duas representantes do departamento, foi
aberto um processo administrativo pela universidade contra o professor e também uma
denuncia formal na Delegacia da Mulher. “O machismo é tão estrutural que várias das
alunas não puderam fazer a denúncia por pressão da própria família, medo da exposição
e até mesmo pelo processo que a vítima de machismo/assédio sofre hoje em dia, de se
perguntar se aquilo foi realmente um ato”, comenta.
Géssica e as demais participantes do Coletivo Feminista se indignaram com
histórias como essa e decidiram organizar uma Campanha Contra Assédio para o
segundo semestre de 2017. A primeira ação será um questionário on-line e anônimo
para mapear os tidos de casos e, depois, serão realizadas atividades pontuais de
informação sobre o que assédio sexual e moral. Como resultado, a campanha pretende
que aconteçam mais denuncias e a responsabilização social e jurídica dos agressores. “A
universidade me parece que segue como nas cidades pequenas, todo mundo sabe quem
são os assediadores, mas ninguém fala, exceto nos seus corredores. Volta e meia
ficamos sabendo de casos que ainda acontecem ou ocorreram”, explica ela.
Além do apoio do DCE, os estudantes a Uesb também dispõe de um serviço da
instituição. O Célula Mater. Mas ele é pouco divulgado e desconhecido na própria
universidade. A organizadora do projeto é Arlene Ribeiro. Segundo ela, o projeto é
voltado para as mulheres que sofrem algum tipo de machismo dentro da universidade e
querem denunciar. Para isso, o projeto conta com uma equipe multidisciplinar composta
por psicólogo, assistente social e advogado, além do encaminhamento para atendimento
médico em casos de lesão física.
Célula Mater atende tanto alunas quanto funcionárias. Seu objetivo orientar as
vítimas para denunciar os agressores e dar apoio psicológico. “Eu me propus a fazer
esse projeto depois de ver que muitas das mulheres dentro da universidade estavam
desamparadas e angustiadas com as injustiças que estavam vivendo. Ver toda essa
situação impune nesse ambiente, me deixou indignada, eu não poderia ficar sem fazer
nada.” O núcleo da Celula Mater fica no Centro de Extensão da Uesb, localizado na
Praça Gerson Sales, s/n, Bairro Alto Maron.