De catador de café na infância a servidor federal nos Correios

Gildevan Batista Mendes, 38 anos, vascaíno, nascido e criado na zona rural do município de Anagé,mudou a sua vida há 15 anos, quando foi nomeado como servidor federal 25 de novembro de 2023 Rose Aguiar e Yasmin Luene

Baiano, religioso, vascaíno, nascido e criado na zona rural do município de Anagé, na Bahia, esse é Gildevan Batista Mendes, 38 anos, ou Gil,  como é conhecido. Ele passou de uma infância e adolescência de trabalho na roça, como catador de café, ao atual cargo de funcionário público federal da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT), na Agência de Barra do Choça, cidade onde vive com a sua família. 

“Nasci e me criei na zona rural”, relembra Gil. A vida em Anagé era bem diferente da realidade que ele possui hoje. Ele e os irmãos, Geovane, Uelton, Tatiane e Ediane, acordavam cedo para catar café nas fazendas. “A nossa rotina daquela época era bem diferente da que eu tenho hoje, pois comecei a trabalhar na roça desde muito novo, aos 8 anos”.

Durante o período da colheita de café, ele juntamente com o o pai e a mãe, João Sousa e Maria das Graças,  e o restante da família viajavam aproximadamente 80 km, de Anagé a Barra do Choça. Eram três ou quatro meses do ano em que trabalhavam nesses locais, dormiam em  alojamentos instalados nas próprias fazendas e crianças e adultos realizavam as atividades da mesma forma. “Era preciso ajudar em casa”, explicou. Por meio desse trabalho, a família conseguiu adquirir um terreno em Barra do Choça e, a partir daí, ao invés de morarem nos alojamentos das fazendas, conseguiram construir a casa própria e se mudaram definitivamente para a cidade.

O trabalho na roça impediu Gil de realizar os estudos no período padrão de escolaridade. “Eu sempre achei importante estudar. Não desisti”, acrescentou. Em 2004, aos 20 anos, ele ainda estava no primeiro ano do Ensino Médio, em Anagé. Para  não parar de estudar, naquele ano, quando iniciou a colheita de café e a família retornou para a colheita em Barra do Choça, ele transferiu a matrícula para a cidade. “Trabalhava de dia, e estudava à noite.” Ele só concluiu a educação básica aos 22 anos. “Concluir os estudos foi muito complicado para mim, porque, às vezes, a gente tinha que sair da escola para ir trabalhar na roça”, relembrou.  

Em 2006, enquanto estudava no último ano do Ensino Médio, surgiu o edital do concurso público dos Correios. Ele prestou o concurso e foi aprovado. A convocação dos aprovados demorou dois anos. Enquanto aguardava ser chamado, o desemprego fez Gil partir para a cidade de Itapetinga, Bahia, atrás de oportunidades de trabalho em outros setores. “Busquei um trabalho que não fosse tão desgastante como o trabalho na roça”. Somente em 2008, ele foi nomeado e começou a atuar como carteiro nos Correios.

Já são 15 anos dessa nova realidade. Primeiramente, Gil foi lotado para atuar em Caatiba, 37 km de onde morava, e depois do estágio probatório de três anos, conseguiu transferência para Barra do Choça. “É muito confortável morar e trabalhar aqui. Barra do Choça é uma cidade muito boa de se viver. Tem uma boa estrutura, o que nos dá uma melhor condição, então, aqui eu me sinto muito bem.”

A jornada nos Correios de Barra do Choça é bem diferente daquela vivenciada na sua infância na zona rural de Anagé. “Eu entro às 7h30 e trabalho até às 12h. Almoço em casa e retorno às 13h30 para o segundo turno. E às 17h, eu finalizo meu expediente”. Essa rotina é de segunda a sexta-feira. Seu trabalho consiste no planejamento logístico e de distribuição nos Correios. Normalmente, suas tarefas incluem o recebimento de caixas, a separação das encomendas, a triagem e o ordenamento dos pacotes e correspondências e a distribuição em domicílios, nas empresas ou nos departamentos públicos de Barra do Choça. “Nós trabalhamos em equipe, coordenados pela gerência, mas cada um tem seu distrito de trabalho”, explicou.Eu já trabalhei por toda a cidade. A gente fica de seis meses a um ano em um determinado setor e depois troca com um colega, nisso eu acabo conhecendo a cidade toda.”

Os distritos, como são chamados os setores nos quais a cidade é dividida, são compostos por grupos de bairros. O carteiro conta ainda que no início da semana a carga de trabalho costuma ser bem maior, igual acontece nas datas comemorativas no decorrer do ano. No Natal, Ano Novo e nos meses de maio e junho, por exemplo, o movimento também cresce bastante. Isso acontece por causa do e-commerce. O comércio que ocorre no meio eletrônico, compras, vendas e transações financeiras realizadas de forma on-line. As chamadas compras na internet, que são entregues tanto pelas transportadoras, como, principalmente, pelos Correios.

Outra mudança importante trazida pela estabilidade do funcionalismo público, em comparação ao trabalho nas lavouras de café do seu passado, foi a segurança do salário todo mês. A média salarial dos funcionários dos Correios varia de acordo com os aspectos das funções e com o tempo de serviço na empresa. O salário base hoje está entre R$2.000,00 e R$2.400,00, tendo auxílio alimentação, gratificações e os descontos previdenciários. “Varia muito de funcionário para funcionário, depende do tempo de empresa, do cargo que exerce, depende da função que desempenha. Então têm vários quesitos que influenciam no salário final.”

Uma das mais importantes conquistas na vida pessoal do carteiro foi a formação no ensino superior. Entre 2013 e 2016, Gil recebeu uma bolsa de estudos para cursar Análise de Sistemas na antiga Unopar, hoje sob a marca  Faculdade Anhanguera, em Vitória da Conquista. A bolsa foi possível graças ao desempenho na prova do Enem, com uma nota acima da média. Com isso, conseguiu fazer o curso na modalidade de educação semipresencial. “Eu só precisava ir até a faculdade presencialmente uma vez na semana.”

O carteiro contou orgulhoso, que, além do trabalho, sua vida também é de dedicação à sua família, aos seus amigos e ao lazer. Casado com Andressa Pereira, a quem conheceu quando trabalhava nas colheitas de café, pois ela morava em frente a uma das fazendas em que ele trabalhava naquela época. Os dois são pais de Eduardo de 5 anos e de Guilherme de 11. Os encontros de família na casa de seus pais aos fins de semana já são um costume seguido por todos. “Minha mãe e meu pai são vivos, graças a Deus! E a gente sempre se encontra na casa deles. Isso acontece todo final de semana.”

A religiosidade para Gil também recebe atenção. “Gosto muito de participar das coisas da Igreja. Sou muito religioso, sou católico e gosto muito de ir às missas todo domingo e, às vezes, até as missas do meio da semana. Meus filhos e minha esposa também me acompanham tanto nas missas, quanto nas pastorais. Eu gosto muito da convivência na Igreja Católica.”

Os momentos de lazer e diversão para Gil ficam por conta dos exercícios na academia e do futebol. Antes, ele até praticava o esporte, mas hoje se contenta em acompanhar o seu time do coração, o Vasco da Gama. “Pense em um time que está me dando trabalho, mas desde criancinha que eu sou vascaíno”.

A trajetória de Gildevan é marcada por dificuldades, superações e por acreditar no quanto a educação poderia transformar a vida. “Trabalhava e estudava, e isso mudou a vida.”

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