#Coronavírus: especialistas explicam a importância do fechamento do comércio em Conquista
O decreto de suspensão das atividades do setor foi mantido pelo prefeito Herzem Gusmão, contrariando 54% dos comerciantes locais, que querem o retorno imediato do atacado e varejo 29 de março de 2020 Afonso Ribas e Karina CostaMesmo com a pressão de 54% dos comerciantes conquistenses pela reabertura total do comércio em Vitória da Conquista, o prefeito Herzem Gusmão decidiu renovar o período de suspensão temporária das atividades do setor. A decisão, que não se aplica às organizações responsáveis pelo abastecimento de gêneros alimentícios, cuidados com a saúde e outros serviços considerados essenciais, foi divulgada neste domingo (29/03), e visa a contenção do novo coronavírus na cidade, que registra 109 casos suspeitos até o momento.
A manutenção da medida estabelecida pelo Decreto Municipal 20.202 contraria pedido de reabertura do comércio varejista e atacadista, enviado por meio de ofício à PMVC pela Câmara de Dirigentes Lojistas e pela Associação Comercial e Industrial (ACIVIC), no dia 26. Para especialistas entrevistadas pelo Avoador, o retorno integral das atividades comerciais na cidade representaria um perigoso retrocesso na política local de enfrentamento à Covid-19 e iria na contramão do que orienta instituições como a Organização Mundial da Saúde (OMS) e a Sociedade Brasileira de Pneumologia e Infectologia.
Segundo a médica pneumologista, Damille Sandes, a doença causada pelo novo coronavírus está em fase de disseminação comunitária, por isso, ações que garantam maior isolamento social, como o fechamento do comércio e indústria, são essenciais. Para ela, a manutenção dessas medidas é um ato de responsabilidade que está em consonância com o posicionamento de autoridades do poder público preocupadas com a saúde da população.
“Levando-se em consideração que grande parte da população infectada pelo vírus apresenta-se assintomática, o potencial de transmissão da doença torna-se elevado. Mesmo sem casos confirmados na nossa cidade até o momento, sabemos que existe uma grande restrição quanto à realização de testes para confirmação diagnóstica, sendo esses selecionados apenas para casos graves e de alta suspeita clínica. Dessa forma, muitos casos são subdiagnosticados”, explicou a pneumologista.
A professora dos cursos de Medicina e Psicologia da Uesb e também integrante do Conselho Municipal de Saúde, Monalisa Barros, avalia que, neste momento, uma eventual reabertura do comércio em Conquista e, em outras cidades brasileiras, sobretudo aquelas onde já existem casos confirmados, poderia fazer com que esses municípios seguissem os mesmos passos de cidades da Itália como Milão. Lá, os casos de contágio do coronavírus explodiram quase um mês depois de o prefeito Giuseppe Sala divulgar o vídeo da campanha “a cidade não para”. Posteriormente, o prefeito admitiu à imprensa italiana que a atitude foi um erro.
No país, a campanha “O Brasil não pode parar”, que é também defendida por empresários em diversas outras cidades além de Vitória da Conquista, foi endossada pelo próprio presidente da República, Jair Bolsonaro, que em pronunciamento realizado na terça-feira, 24, criticou as medidas de isolamento social e chamou o coronavírus de “gripezinha”. A professora Monalisa Barros considera que a entrada do Brasil na pandemia do coronavírus depois de vários outros deveria ter permitido um aprendizado para não cometer os mesmos erros.
“Eu acredito que a reabertura seria uma temeridade, porque ela não tem base em nenhum estudo. Parte da vontade histérica e egoísta do presidente da República. A situação é muito grave e a gente ainda está no início”, destaca.
Na tarde de sexta-feira, 27, um dia depois da publicação de decreto municipal que ampliou o número de serviços considerados essenciais na cidade, lojistas realizaram uma carreata reforçando o pedido de reabertura completa do comércio a partir da próxima segunda, 30. A mobilização circulou pela Avenida Olívia Flores, foi até o Centro, e finalizou na zona oeste de Conquista.
A questão econômica
Para o professor do curso de Economia da Uesb, Marcos Tavares, a preocupação dos lojistas com relação aos seus negócios é compreensível, pois o fechamento não suspende custos fixos como aluguel, salários de funcionários, segurança, impostos etc. Contudo, ele ressalta que essa, por enquanto, é a melhor decisão a ser tomada até que as autoridades sanitárias, infectologistas e outros órgãos assegurem que o governo terá a capacidade de atender a todos que necessitarem de hospitais ou descubra outras medidas que controlem a propagação da covid-19.
“O que os lojistas talvez não percebam é que, se o vírus se disseminar, o problema será mais grave, a crise será mais profunda, inclusive no município. Pessoas podem sofrer sem atendimento e morrer. Pelo menos é isso que vem acontecendo em outros países. Cidades italianas que não adotaram medidas restritivas ou demoraram a fazer isso sofrem hoje com a crise muito mais do que outras que fecharam seu comércio parcialmente”, esclarece Marcos.
O problema, segundo o professor, é que o poder público não apresenta nada, concretamente, para que os lojistas, microempreendedores e feirantes assegurem a manutenção dos seus negócios. Entre outras medidas, ele sugere a suspensão de cobranças, redução de tributos, liberação de linhas de crédito com carência de dois ou três anos e implementação de lei que impeça a elevação da taxa de juros nos bancos privados.
“O governo municipal pode também dialogar com os lojistas e ver como pode contribuir. Suspensão do IPTU do ano? Taxas de iluminação pública e de lixo? São possibilidades. Não é só fechar, embora necessário. É importante apresentar propostas concretas de como o Poder Municipal vai gerenciar a crise”, enfatizou o economista.
Foto de capa: Leila Costa