Praças de Conquista revelam prioridades e descasos da Prefeitura
Enquanto há praças na cidade que recebem mais investimento, outras estão praticamente abandonadas, sem a devida manutenção 2 de outubro de 2021 Gabriela Souza, Mariana Oliveira“Essa praça não tem nada, eu acho até ela meio jogada”, lamenta a agente de saúde Renata Santos Soares, 31, sobre a Praça Gerson Sales, do bairro Alto Maron. Essa é a realidade de Vitória da Conquista: enquanto há praças na cidade que recebem mais atenção, há outras que estão praticamente abandonadas.
No Loteamento Vila América, dentro do bairro Boa Vista, na Zona Sul de Conquista, há 14 praças, de acordo com Moisés da Silva Santos, conhecido como “Dida”, líder comunitário do loteamento. Porém, as praças não têm nada, nem mesmo bancos para as pessoas se sentarem. Segundo Dida, é preciso dar mais atenção à região do Vila América e arborizar essas praças. “Você não tem uma praça para as crianças se divertirem”, lamenta o líder comunitário.
Uma praça é um local aberto, público, para livre convivência e recreação de pessoas de uma determinada cidade. Em Conquista, existem praças com muitos jardins, árvores, fontes de água e bancos para que os cidadãos possam relaxar e contemplar a beleza do ambiente, ou se reunir com amigos, como é o caso da Praça Tancredo Neves, no Centro.
Algumas, mais modernas, possuem também brinquedos para crianças, quiosques para a venda e consumo de alimentos e, até mesmo, quadras para prática de esportes e aparelhos de ginástica e musculação, a exemplo da Praça Norberto Aurich, no bairro Patagônia. Essas duas são praças bem cuidadas e preservadas pela administração do município.
Mas, mesmo sendo uma das praças mais tradicionais de Conquista, a Gerson Sales é carente de cuidados da administração pública do município. Sem manutenção, as árvores estão mal cuidadas, sem poda e algumas estão morrendo. Com o nome de um ex-prefeito de Conquista, Gerson Gusmão Sales, que governou a cidade durante os anos de 1951-1955 e 1959-1963, a praça possui uma área com cerca de 8.285 m², ocupada por árvores, arbustos, bancos e quiosques.
Renata conta que não frequentava a praça mesmo tendo morado no bairro durante 28 anos. Segundo ela, as pessoas utilizam a Gerson Sales apenas como travessia de uma rua para outra e não costumam se sentar e permanecer nela por muito tempo. No chão, onde devia ter grama, tem apenas uma terra seca. A única parte de lazer são as mesas de xadrez, que estão com os bancos quebrados, o que dificulta o uso pela população.
A agente de saúde lembra que a Gerson Sales sempre foi assim e que, apesar de ser próxima do Centro da cidade, a praça está esquecida. “Não tem grama, só tem mato aí. Tem um bocado de árvores com erva-de-passarinho, que pode cair. Eu não acho ela bem cuidada.” Segundo ela, sugere que a praça poderia ser mais atrativa para os moradores se a Prefeitura equipasse o local com aparelhos de musculação e brinquedos para crianças. “Igual tem naquela outra [Praça Sá Barreto]. Depois que botou lá o pessoal começou a visitar mais a praça.”
Norberto Aurich e Sá Barreto: semelhanças e contrastes
Fruto de uma permuta entre a Prefeitura e a Pel Construtora e Incorporadora, a Praça Norberto Aurich, no bairro Patagônia, foi inaugurada em 3 de agosto de 2019. Situada entre as avenidas Paraná e Santa Catarina, a obra possui mais de 10 mil metros quadrados de construção, o equivalente a um campo de futebol oficial. Na praça, que homenageia o primeiro professor de basquete do Sudoeste da Bahia, a população pode desfrutar de quiosques, quadra poliesportiva, com arquibancada, equipamentos para ginástica ao ar livre, parque infantil, 46 vagas para estacionamento, além de sanitários públicos. Durante a inauguração, o ex-prefeito de Conquista, Herzem Gusmão, declarou que “foi uma justa homenagem ao professor Norberto pela grande contribuição que ele deu à cidade”.
De acordo com o comerciante Romualdo Alves de Oliveira, 50 anos, antes da construção da praça, o espaço era utilizado como oficinas e depósito de carros velhos. Segundo ele, a Norberto Aurich “caiu como uma luva” para a população do bairro. O dono de uma lanchonete em um dos quiosques da praça desde a inauguração diz que o período de maior movimentação é no final de semana, especialmente no domingo à tarde.
Diferente da Gerson Sales, a praça Norberto Aurich é bem cuidada e possui boa infraestrutura, mas carece de uma área coberta e mais árvores. Além disso, Romualdo aponta que o lixo do fim de semana só é recolhido na segunda-feira à tarde. “No meu ponto de vista, ela só precisava do recolhimento de lixo na segunda de manhã. Esse recolhimento é mais à tarde. A limpeza é feita, porém, os vasos ficam cheios porque são retirados de tarde. Eu acho que deveria ser de manhã.”
Segundo o comerciante, a praça é um local seguro de se frequentar. Enquanto esteve presente no local, na manhã do dia 9 de setembro, a equipe do Avoador notou a presença da Guarda Municipal na praça. Ele lembra que, antes da Guarda, alguns dependentes químicos faziam da Norberto Aurich um ponto de encontro para usar substâncias ilícitas. “Naquele corredor alí [entre as quadras poliesportivas e a arquibancada, já estava virando uma Cracolândia”. De acordo com Romualdo, a polícia fazia algumas rondas, mas não inibia a volta dos usuários de drogas.
Morador do bairro Jurema, próximo ao Patagônia, Leonardo Caetano Pita, 45 anos, frequenta a Norberto Aurich há pouco tempo. Ao descobrir uma ciatalgia, dor no nervo ciático na região lombar, resolveu praticar exercícios físicos para tratar seu problema de saúde. “Minha tia falou que tinha uns aparelhos [de ginástica] aqui, aí eu vim aqui fazer, pra ver se melhora mais meu desempenho”, já que no bairro onde mora não há nenhum local público com esses equipamentos.
Por estar desempregado e morando com a mãe, Leonardo diz estar com tempo disponível e vai continuar utilizando a academia ao ar livre da praça pela necessidade. “Nem todo mundo tem condição financeira de pagar um tratamento, como é meu caso, aí depende dessas coisas.” Ele chegou a fazer fisioterapia no Hospital São Vicente, pelo Sistema Único de Saúde (SUS), mas com a demora para conseguir renovar o tratamento gratuito, começou a se exercitar na praça. “O mínimo que o governo faz, ajuda a gente. Coisas simples ajudam muito o próximo. Quantas pessoas moram longe e não têm [acesso a] esses equipamentos, não têm condições de vir numa praça dessa? Temos que preservar e cobrar mais das autoridades para ter mais dessas coisas.”
Assim como a Norberto Aurich, a Praça Sá Barreto, no bairro Cruzeiro, possui equipamentos para ginástica ao ar livre e parque infantil. Entre as quatro praças escolhidas pela equipe de reportagem, ela tem a maior área, com aproximadamente 12.175 m², distribuídos também entre região de grama, árvores, bancos, passeios, quiosques e pista para prática de cooper. Parte da história de Conquista, a Sá Barreto é uma praça centenária e pode ser vista em algumas fotos antigas da Casa Padre Palmeira, construída em 1920, em frente à praça.
Reformada em março deste ano, a Sá Barreto recebeu investimento de R$ 375 mil da Caixa Econômica Federal, em conjunto com recursos do Tesouro Municipal. Apesar do pouco tempo de revitalização, algumas lixeiras e brinquedos do parque infantil já estão quebrados. Além disso, segundo Alane Lisboa Macedo, 19, moradora do Cruzeiro, a administração pública deveria “colocar brinquedos mais adequados para crianças mais menores”, na faixa dos três aos cinco anos de idade. Aline, que tem um filho nessa faixa etária, acha os brinquedos do parquinho perigosos para os pequenos.
A jovem relata que, quando esse espaço foi reformado, inicialmente, várias pessoas frequentavam a praça, mas, com o tempo e a falta de manutenção por parte da Prefeitura, o número de visitantes diminuiu. Em relação à segurança, Aline conta que a Polícia sempre está presente no local, porém acha a praça um pouco violenta. Ela lembrou que, naquele mesmo dia da entrevista, 9 de setembro, havia presenciado a briga de dois homens na Sá Barreto.
Já para o chaveiro Rubens Barros, 79 anos, a Sá Barreto é tranquila e sossegada. Segundo ele, nunca presenciou nenhuma ação violenta no local, desde que chegou para trabalhar na praça. Ao ser realocado da Avenida Olívia Flores pela Prefeitura de Conquista para a praça Sá Barreto, há cinco anos, o morador do Candeias a considera um pouco “paradinha”, do ponto de vista comercial, de tão pacata que é. Diz ainda que vê a Prefeitura fazer a limpeza do lugar e que a reforma só trouxe benefícios. “Fizeram já um parquinho ali, fez uma mini-academia para adulto, ali do outro lado, um calçadão para caminhadas, sabe, e melhorou bastante.”
O chaveiro não se recorda de ter visto muitos eventos serem realizados na praça e que o único do qual se lembra foi a recente manifestação do Grito dos Excluídos, no dia 7 de setembro. Rubens conta que assistiu a todo o protesto, que foi pacífico e que até forneceu energia elétrica do seu quiosque para o aparelho de som dos manifestantes.
Para o geógrafo, arquiteto e urbanista Mário Rubem Santana, a praça deve ser um lugar em que as pessoas se sintam bem, não basta apenas construir esse espaço e deixar sem alternativas de lazer. O urbanista diz que é preciso “conseguir criar nas pessoas que estão ali, uma convivência com aquela praça, para que essas pessoas sintam que a praça também é sua”.
Praça Tancredo Neves: a pedra preciosa da “joia do sertão baiano”
Localizada no Centro da cidade, a Praça Tancredo Neves é conhecida como um dos principais pontos turísticos e cartões postais da “joia do sertão baiano”, apelido de Conquista. Cercada de casarões antigos e com uma das extremidades voltada para a Catedral Metropolitana de Nossa Senhora das Vitórias, a Tancredo Neves é a praça mais visitada pelo público, principalmente em épocas natalinas, quando fica repleta de luzes e símbolos do Natal.
A Praça Tancredo Neves foi inaugurada em 1985 pelo então prefeito José Pedral. Está situada onde antes era a Praça da República e é um dos lugares mais antigos de Conquista, com mais de 200 anos. Inicialmente servia como centro do Arraial da Conquista, antigo nome do município. A primeira praça da cidade ia da Catedral até a Primeira Igreja Batista Bíblica, o que formava a chamada “Rua Grande”. Na década de 1940, o espaço foi dividido em duas praças: a da República e a Praça Barão do Rio Branco.
Com mais de 8,5 mil metros quadrados preenchidos por vários tons de verde e espelhos d’água, a Tancredo Neves é um refúgio para quem busca contato com a natureza. Para o técnico de climatização Danivaldo Nascimento, 32, “é bom ver a natureza, no meio da cidade, é melhor ainda”. Morador de Lauro de Freitas, o técnico veio trabalhar na reforma da Catedral e sempre visita a praça depois do almoço para descansar. Danivaldo relata que a manutenção da Tancredo Neves é feita com frequência, porque vê os trabalhadores limpando, podando as árvores e molhando as plantas, e ainda faz uma comparação com as praças da sua cidade natal: “para as que tem lá em Lauro de Freitas, essa aqui é um luxo”, afirma.
Luciano Santana, 43, concorda com Nascimento. Para Luciano, a praça Tancredo Neves não precisa de mais nada, em relação à limpeza, segurança e ornamentos, apenas de banheiros. “Não tem banheiro, para usar o banheiro tem que ir lá embaixo, no Terminal [Estação Herzem Gusmão].” O morador do bairro Campinhos, distante 10,1 km do Centro de Conquista, conta que costuma frequentar a Tancredo Neves duas vezes por semana, pelo sossego e para “pegar o orvalho da natureza”.
A Tancredo Neves, que leva o nome do primeiro presidente eleito no Brasil pós-ditadura militar, abriga não só várias espécies de árvores, peixes e pássaros, inclusive patos, mas também o Monumento aos Mortos e Desaparecidos Políticos da Bahia. Construído em 1998 pelo grupo Labor – Assessoria, Documentação e Pesquisa, o monumento homenageia quem sofreu os horrores da Ditadura Militar do Brasil, instaurada de 1964 até 1985, quando se deu a redemocratização no país por meio das eleições diretas para presidente, que elegeram Tancredo Neves. Ele não chegou a ser empossado, pois faleceu devido a um tumor no intestino e quem assumiu a presidência em seu lugar foi o vice José Sarney. A obra de arte da praça representa a ausência, segundo a Prefeitura, e foi confeccionada pelos conquistenses Romeu Ferreira e Ana Palmira Cassimiro.
A equipe de reportagem do Avoador entrou em contato com a Prefeitura para saber a quantidade de praças existentes na cidade, sobre a frequência de manutenção e limpeza das praças e como é feita a segurança desses espaços, mas até o fechamento desta matéria, não obteve um retorno.