“A gente quer derrotar Bolsonaro e tudo que ele representa”, diz Sofia Manzano

A pré-candidata à presidência da República pelo Partido Comunista Brasileiro (PCB) é professora do curso de Economia da Uesb há nove anos 30 de maio de 2022 Gabriela Matias, Luana Carvalho, Marcos Paulo

Sofia Manzano é militante do Partido Comunista Brasileiro (PCB) desde os 17 anos e, em 2022, representa o partido nas eleições presidenciais. Não é a primeira vez que participa do pleito eleitoral, em 2014,  foi candidata à vice-presidência na chapa de Mauro Iasi. Ela é uma paulistana de 50 anos, mãe de um filho de 25 anos, que há nove anos mora em Vitória da Conquista, onde é professora do curso de Economia da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia. 

Mestre em Ciências Econômicas pela Pontifícia Universidade Católica (PUC) e Doutora em História Econômica pela Universidade de São Paulo (USP), Manzano é também autora do livro “Economia política para trabalhadores”, cuja edição pela editora Instituto Caio Prado Jr está esgotada. 

Em entrevista para o Avoador, Sofia Manzano detalhou a sua trajetória pessoal e profissional, além de destacar as razões que a levaram à candidatura presidencial e suas principais propostas.

Confira abaixo a entrevista completa.

Como surgiu a ideia dos temas do mestrado e do doutorado? Ambos falam sobre o mercado de trabalho para as minorias?

Eu sempre me interessei muito pelo mercado de trabalho, porque é onde ocorre a produção, através dos trabalhadores que produzem toda a riqueza, e ao mesmo tempo, é também onde se estabelecem os contratos entre o capital e o trabalho. É aí que a gente pode identificar, por exemplo, qual é o grau de exploração dos trabalhadores e das trabalhadoras, como eles são protegidos ou não pela legislação e qual é a ação coletiva desses trabalhadores no mercado de trabalho, através dos seus sindicatos. No meu mestrado eu fiz uma pesquisa sobre a dinâmica do mercado de trabalho no ramo das montadoras de veículos, as modificações que ocorriam na estrutura do mercado de trabalho nessas montadoras.

No doutorado, eu passei a estudar mais a questão da desigualdade mesmo, e principalmente a literatura que trata do combate à desigualdade, porque muito se fala da desigualdade que existe hoje no capitalismo: algumas pessoas ganham muito e outras estão morrendo de fome, sendo que a riqueza continua sendo produzida. Muitos teóricos entendem que o problema da desigualdade é do indivíduo e da sociedade como um todo. É como se o indivíduo fosse culpado pela sua situação, seja porque ele é discriminado em razão ao sexo ou à raça ou porque ele não tem a educação, a saneamento, a diversas estruturas sociais. Essas teorias nunca levam em consideração que é o próprio capitalismo que estrutura essa desigualdade, então no meu doutorado eu procurei trabalhar mais com essa questão teórica do debate sobre a desigualdade.

Neste momento, os meus colegas e as minhas colegas de partido entendem que é importante ter alguém com debate político qualificado.

Como surgiu a sua candidatura à presidência da República?

Eu sou militante comunista há muito tempo, desde 1989, no Partido Comunista Brasileiro (PCB), e neste processo todo, a gente sempre construiu as lutas, tanto as lutas eleitorais quanto às lutas políticas, por exemplo: na juventude, eu participei do movimento estudantil, de centro acadêmico, já fui para vários congressos da União Nacional dos Estudantes (UNE), depois também participei no movimento sindical.

O meu partido toma decisões muito coletivas. Não partiu de mim pessoalmente [a atitude de] dizer “Olha, eu quero ser pré candidata”, até porque eu não tenho nenhuma carreira política como diversas pessoas têm, apesar de já ter sido candidata a vice-presidente em 2014, na chapa de Mauro Iasi, candidato a presidente na época. Eu não faço carreira política, não sou uma pessoa que pensa nisso o tempo todo. Eu aceito a tarefa quando é colocada  pelos  meus camaradas. Neste momento, os meus colegas e as minhas colegas de partido, entendem que é importante ter alguém com debate político qualificado, tanto em razão da disputa que está colocada, uma polarização entre Bolsonaro e o ex-presidente Lula, quanto pelo fato de ser economista e entender dos problemas econômicos pelos quais o Brasil está passando.

O meu partido entendeu que era importante colocar essa pré-candidatura e me escolheu para representar, é uma pré-candidatura coletiva no sentido de que somos um grupo que está levando esta pré-campanha. É assim que a gente funciona, ao contrário dos outros partidos que não tem muita afinidade, muita coesão ideológica. Esses outros partidos parecem muito mais com legendas, muitas vezes legendas de aluguel, por exemplo: alguém quer ser candidato, então faz todo um trabalho na sociedade e aí escolhe um partido para se candidatar e negocia com esse partido para poder ser candidato. No nosso caso não é assim, a gente primeiro pensa no porquê que nós vamos disputar uma eleição, pensamos qual é a estratégia que a gente vai levar para esta campanha eleitoral e depois a gente escolhe a pessoa para representar tudo isso.

O PCB lançou um candidato a presidente da República (Roberto Freire) que fez um discurso muito bonito, que tinha uma campanha muito bonita, isso me interessou.

Por que a senhora optou por se filiar ao PCB? Como você descobriu o partido? 

Eu venho de uma família que sempre foi de esquerda e nasci em plena ditadura militar, então eu passei toda a minha infância em meio àquela repressão que se tinha. Como a minha família e os amigos dos meus familiares sempre foram pessoas muito politizadas, na minha casa sempre tinha muito debate sobre política e sobre a necessidade da gente transformar a sociedade para uma coisa melhor, para alguma coisa que não seja tão exploradora, que não seja tão brutal contra os seres humanos. Os anos de 1980 foram de muitas mobilizações sociais e de grandes manifestações: primeiro contra a ditadura, pelas Diretas Já, depois com as eleições pela primeira vez, após décadas que não se votava para presidente. A primeira vez que eu votei para presidente foi na mesma eleição que o meu pai votou pela primeira vez, porque, quando o meu pai alcançou a idade para votar para presidente, já era ditadura. Então você imagina, eu e meu pai indo pela primeira vez votar para presidente da república. A política era uma coisa muito forte para todos nós naquela época, e, em 1989, o PCB lançou um candidato a presidente da República (Roberto Freire) que fez um discurso muito bonito, que tinha uma campanha muito bonita, isso me interessou. Aí eu comecei a militar, conhecer as pessoas em São Paulo e, então, eu continuei no partido construindo as suas propostas políticas para a sociedade.

A gente precisa se colocar, neste momento, para mostrar que algumas questões precisam ser revistas e a população precisa se organizar.

Quais são as principais propostas que está representando enquanto candidata à presidente do Brasil?

A primeira questão que a gente procura trazer para esta pré-campanha eleitoral é derrotar Bolsonaro e tudo que ele representa. Mas, além disso, nós entendemos que um ponto importante é estimular o debate político. No momento eleitoral, toda a população está mais aberta para discutir política, falar de política e pensar em alternativas para além do que costumeiramente ela vê na televisão, no seu dia a dia, que às vezes é muito apassivamento. A situação vai ficando cada vez pior, e as pessoas não veem muita alternativa. Então nós pensamos: “A gente precisa se colocar, neste momento, para mostrar que algumas questões precisam ser revistas e a população precisa se organizar”. Não basta eleger A ou B como presidente da República e esperar que a mágica aconteça. Se a gente não se mobilizar, as coisas não vão acontecer.

Sobre as propostas, pretendemos revogar o teto de gastos que foi instituído no governo Michel Temer, porque isso impede o estado de fazer as políticas públicas necessárias. Por quê? O estado arrecada impostos de todos nós, mas na hora do gasto público para o interesse da população, existe um teto. Quer dizer, ele não pode gastar mais do que aquilo, sendo que o restante dos recursos são gastos com o mercado financeiro e vai enriquecer os mais ricos, vai para o sistema financeiro. 

Além disso, revogar também as contra reformas que foram aprovadas nos últimos seis anos, mas não só nos últimos seis anos. Pretendemos revogar a Reforma Trabalhista, que degradou ainda mais as condições de trabalho ao permitir tipos de contrato sem nenhuma segurança para o trabalhador e para a trabalhadora, sem estabilidade, sem garantia salarial, nem a garantia dos direitos mínimos que esses trabalhadores precisam ter. É necessário também revogar a Lei de Responsabilidade Fiscal, que impede os municípios e os estados de fazerem as suas políticas públicas de acordo com os seus orçamentos

A revogação da Reforma da Previdência é fundamental, porque a juventude hoje dificilmente vai conseguir se aposentar se essa reforma permanecer. Então a gente precisa colocar na ordem do dia da política de todas e todos nós, que nós não queremos esse sistema previdenciário como está agora. Nós queremos um sistema previdenciário que dê possibilidade para os jovens, ao trabalharem determinado tempo, alcançarem o direito de se aposentar, e não como agora, que fica praticamente impossível conseguir a aposentadoria.

 

Foto destaque: Divulgação PCB

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