“Está bonito, está lindo, mas de que adianta se não tem ônibus”, diz usuária do transporte público de Conquista
Inaugurada há dois meses, a Estação substitui o antigo terminal Lauro de Freitas e quer representar modernidade, mas, na prática, não trouxe melhorias ao transporte urbano da cidade 11 de agosto de 2021 Beatriz Oliveira, Leiane Oliveira, Mikhaelle Piagio e Erick Gomes (Colaborador)“Projetada para oferecer segurança e conforto para quem usa o transporte coletivo, a Estação Herzem Gusmão atende a uma demanda antiga da cidade e realiza um sonho da população. Bonita, moderna e à altura de Vitória da Conquista, a estação dará mais fluidez ao trânsito, tendo as pessoas como prioridade”. Este pequeno texto faz parte do vídeo promocional da Prefeitura Municipal de Vitória da Conquista, publicado um pouco antes da inauguração da estação, que ocorreu no dia 2 de junho de 2021. Entretanto, há pouco mais de dois meses de sua inauguração, a população do município está longe de viver um sonho realizado.
A estação está de visual renovada, mas problemas antigos têm afetado a vida do cidadão que depende do serviço de transporte coletivo. É o caso de Tainara Silva, de 25 anos. A funcionária do Shopping Boulevard diz que a mudança estética a agradou, mas a funcionalidade ainda está longe de ser a ideal. “Está bonito, está lindo, mas de que adianta se não tem ônibus?”, reclama.
Silva e outros funcionários do shopping enfrentam problemas para retornar para casa, devido a escassez de ônibus em circulação após as 22 horas. Os funcionários, por muitas vezes, precisam optar pelo uso do transporte de aplicativos para se locomover. “Eu dependo do transporte, e eles esquecem que há funcionários que dependem do transporte coletivo. Todos querem chegar em casa cedo, encontrar com as suas famílias”, lamenta. Para que atenda a necessidade da população, muito ainda precisa ser feito no transporte público da terceira maior cidade da Bahia. “Nós moramos em uma cidade enorme, tem que ter mais ônibus, tem que ter mais linhas”, questiona Silva.
Atualmente, as empresas responsáveis pelo transporte são a Viação Rosa e Atlântico Transportes, que trabalham em caráter emergencial desde novembro de 2020. Com uma frota de 50 ônibus e 10 micro-ônibus, a Atlântico Transportes firmou um contrato com a Prefeitura de R$14,4 milhões, que tem validade de 180 dias, e pode ser prorrogado por mais seis meses ou encerrado antes. A Viação Rosa, opera desde o dia 24 de maio de 2019, e desde então R$70.395.225,66 foram gastos em 8 renovações de contratos de 180 dias.
De acordo com o presidente do Sindicato dos Rodoviários de Vitória da Conquista, Álvaro Souza, o prolongamento do contrato emergencial tem trazido prejuízos para a Prefeitura. Isso porque, enquanto as empresas atuam em contrato emergencial, a gestão municipal paga pelo quilômetro rodado. Dessa maneira, quanto mais ônibus são disponibilizados, maior o custo para a cidade. “Então quanto menor a quantidade de ônibus, menor também é o prejuízo da Prefeitura. Por isso que o bom mesmo seria já iniciar imediatamente o processo licitatório. Que a Prefeitura fica livre de fazer pagamentos de contrato”, explica.
“O sonho da população”
“A obra da Estação de Transbordo, com previsão de conclusão em 18 meses, será entregue 5 meses antes do prazo. A Estação de Transbordo Herzem Gusmão será um espaço apenas para embarque e desembarque de passageiros, pois os ônibus não ficarão estacionados no local. O projeto incluiu, além de um moderno projeto arquitetônico, com proteção lateral e cobertura nos pontos de parada, nova pavimentação asfáltica, drenagem, iluminação, acessibilidade e paisagismo.” Essas são as palavras de entusiasmo publicadas no site da câmara municipal de Vitória da Conquista no dia 15 de maio de 2020, um mês antes da inauguração da estação.
O antigo terminal Lauro de Freitas que tinha os pontos divididos em três repartições e dividia espaço com carros, foi substituído pela Estação Transbordo que unificou as três repartições em uma só e reduziu o fluxo de carros nas avenidas do entorno. Agora a Estação também conta com calçadas com acessibilidade, iluminação e cobertura lateral.
A nova estação de transbordo passou por uma reforma no valor de R$6.962.295,80 proveniente do Financiamento à Infraestrutura e ao Saneamento (Finisa II), da Caixa Econômica Federal. A obra teve início no dia 28 de Abril de 2020, sendo concluída 1 ano e 3 meses depois. Foi realizada pela empresa PJ Construções e Terraplanagem Limitada, que venceu o processo licitatório lançado pela prefeitura e fechou um contrato de 18 meses com a Prefeitura de Conquista.
O visual do terminal foi renovado, a estrutura trouxe mais conforto para o usuário do transporte coletivo, a amplitude e organização das informações sobre as linhas tornaram a experiência mais fluida. Entretanto alguns problemas antigos, como super lotação dos ônibus, frota antiga, atrasos, e desconforto na estação ainda não foram solucionados. Tierre Freitas, 25 anos, estudante do nível superior, fala que o fluxo de ônibus o atende bem durante a semana, mas este cenário muda no final de semana, quando o fluxo é insuficiente: “É terrível! Já esperei quase 50 minutos por um ônibus”.
Para Tierre, a nova estação facilitou em alguns aspectos a sua experiência como usuário: “ O que tinha de ser feito, foi feito. Melhorou a amplitude, mobilidade e deu um novo visual ao centro da cidade. Acho que ficou muito bom”, elogia.
Porém, o sonho da população ainda não foi realizado, e para que isso aconteça, algumas coisas precisam mudar. “Vejo que faltam boas empresas de ônibus, que prestem um bom serviço, dispondo de uma quantidade de veículos que atenda a população. Sem que elas fiquem perdendo tanto tempo aguardando nos pontos de ônibus. Se isso fosse corrigido, melhoraria a experiência de todos os usuários”, aponta Tierre.
Já a estudante Maria Santos reclama dos atrasos e do estado de conservação dos ônibus. “Eu costumo pegar o D32 [Nossa Senhora Aparecida x CEMAE] e demora muito pra passar ônibus, eu fico meia hora esperando e geralmente são bem lotados”. Para ela, a reforma da Estação não melhorou sua experiência como usuária do transporte público: “pra mim, não mudou nada”.
Para o professor de Direito Ambiental, Urbanístico e Agrário da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (Uesb), Cláudio Carvalho, uma das alternativas para melhoria da mobilidade urbana em Conquista, é que outras regiões do município também tenham estação de transbordo, com outros subcentros urbanos que poderiam até se desenvolverem economicamente. “Quando a Avenida José Pedral Sampaio estiver efetivamente concluída, com a sua extensão total de cerca de 13 km, você teria condições de ter a chamada linha bairro-bairro, sem necessidade de passar pelo Centro da cidade.”
A vendedora Amanda Silva dos Santos relata que os horários disponíveis não suprem as necessidades dos que necessitam se locomover após as 22 horas. “D33 [Conquista VI x Uesb] passava 22h30 no Boulevard, porém o último ônibus para o meu bairro saía às 22h30, qual a lógica?”
Outro problema que Santos enfrenta é com a integração entre ônibus. “Eu pegava aqui no shopping o D33 [Conquista VI x Uesb] e chegava no Centro para pegar o R01[Vilas Serranas x Centro], só que não dava integração. O motivo é que a catraca do ônibus era D30 [Vilas Serranas x Uesb] e, como o D30 fazia a mesma rota, não dava integração. Isso era um erro deles na catraca. Fui reclamar na Atuv, e lá disseram que só o fiscal poderia resolver meu problema. Como o fiscal não estava, mandaram eu voltar outro dia”.
Ela ainda reclama do valor da tarifa, que não corresponde ao serviço ofertado. “Só acho que o valor da tarifa não é justo, estamos indo e voltando do trabalho cansados e somos obrigados a pegar ônibus lotado, sem nenhuma ventilação. Precisamos de mais (ônibus), não podemos esquecer que estamos em pandemia”, desabafa a vendedora.
Para a estudante de Jornalismo da Uesb, Andressa Oliveira, a preocupação maior é em contrair a covid-19 devido à superlotação dos veículos do transporte coletivo. “Os ônibus estão sempre lotados, não há telas de proteção para o motorista e o cobrador. Às vezes fica tão cheio que não sobra espaço para se locomover dentro dele. Tenho medo de pegar o vírus, mas dependo do transporte”, relembra. “A Prefeitura precisa ser mais responsável com o cidadão conquistense. O povo paga um valor que deveria ser para um transporte de qualidade, mas o que existe são aglomerações, ônibus sucateados e o risco evidente de contaminação. Quem mais sofre são os estudantes e os trabalhadores”. Para apresentar essa realidade, a futura jornalista realizou uma reportagem para a disciplina de Telejornalismo, reproduzido aqui.
Confira os valores das tarifas do transporte coletivo em diferentes cidades da Bahia
Serviços ofertados
A integração é um benefício de unificação do valor da tarifa para usuários que necessitam utilizar duas linhas de ônibus, dentro de um período pré-estabelecido, para chegarem ao destino desejado. De certa forma, essa unificação tarifária proporciona a equidade no acesso às várias regiões da cidade e compensa os usuários pela falta de uma linha direta. De acordo com dados da prefeitura, esse serviço está em funcionamento no transporte em Conquista desde março de 2014.
Para conseguir utilizar esse serviço, é preciso ficar atento a alguns detalhes. Primeiro, não é possível integrar a tarifa em uma mesma linha, já que ambas as linhas precisam ser diferentes e de direções complementares para o destino final. Segundo, existe um prazo de 90 minutos para realizar esse procedimento, que começa a contar a partir do momento em que o usuário passa o cartão pela máquina de validação da passagem. Vencido esse prazo, a passagem é cobrada normalmente de forma integral. Terceiro, esse é um serviço exclusivo dos cartões Bem Escolar, Bem Simples e Bem Vale Transporte.
Para quem deseja obter mais informações ou denunciar falhas no processo de integração, existe o atendimento pelo telefone 3427-9502 e presencialmente na sede da Associação dos Operadores do Transporte Coletivo Urbano (Atuv), situada na Travessa 2 de Julho, 10, Centro.
Em caso de denúncia sobre falha na integração, é preciso ter algumas informações como quais foram as linhas de ônibus utilizadas que ocorreu a falha, a data em que isso aconteceu e o número do cartão eletrônico utilizado. Com essas informações, será aberto um processo de análise juntamente com o relatório do cartão do usuário.
Prefeitura
A Prefeitura de Conquista foi procurada para esclarecer todos os pontos citados nesta reportagem, entretanto não enviou nem uma resposta ao site até a publicação desta reportagem. Porém, nesta quinta-feira (12/08), a gestão municipal divulgou uma nota em que informa que solicitou melhorias junto as empresas de ônibus. De acordo com a publicação, a frota do transporte coletivo terá um acréscimo de 19 ônibus partir da próxima semana.
Foto capa: Reprodução PMVC